estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2004-04-27

Ficções do País Obtuso: Deixa o homem mascar à vontade!

O Paulo Portas foi para o Parlamento, em plena cerimónia de comemoração do 25 de Abril, despachar trabalho e a mascar pastilha elástica? Que descaramento...Imagine-se o Salgueiro Maia a tirar macacos do nariz enquanto avançava sobre a Lisboa retro, censurada e amordaçada de Abril de 74. É todo um passado, um património colectivo, que é posto em causa. Eu naquele dia estava exilado em Aveiro porque nasci lá e sempre tive um fascínio por nevoeiros matinais e geada e moliceiros e vibrei com o 25 de Abril! Juro! Já não me lembro que roupa trazia vestida porque na altura eu ainda não podia adivinhar que 30 anos depois aqueles militares com a barba por fazer íam ser tratados por heróis e sobretudo se veriam na obrigação de vestir fato e gravata para entrar na Assembleia da República. Não sei, não sei se naquele dia já um pouco enevoado na memória da minha infância eu estava ou não a mascar chiclete enquanto ouvia o Adriano Correia de Oliveira mas sei que é considerado feio mascar chiclete em cerimónias protocolares. Sabem que mais? Se o Salgueiro Maia estivesse vivo, haveria de dizer: masca a chiclete à vontade, desgraçado, se te dá prazer, masca. A mim, tanto se me dá como se me arrefece, afinal de contas tenho de voltar para Santarém que no meu Ford Cortina que tenho uma sopa de pedra à espera em Almeirim.