estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2005-02-08

CARNAVAL FLASHES

SOL, RUELAS EMPEDRADAS, TURISTAS E MÁQUINAS FOTOGRÁFICAS
Bairros do Castelo e de Alfama, banhados por um magnífico sol de Inverno. O cortejo carnavalesco serpenteia por um território cinematográfico de ruelas empedradas a paralelepípedos, casas de varandins em ferro forjado, azulejos, eléctricos pejados de turistas encantados e sorridentes que não perdem a oportunidade para tirar mais uma foto.
"TOM TOM TOM TOM TOM TOM TOM, OEH EOH!"
À frente, sempre à frente, abrindo caminho pelas ruas adormecidas do Castelo, vão os tambores ritmados e quase hipnóticos dos Tocándar (www.tocandar.com), uma espécie de Olodum da Marinha Grande que já vão no quinto ano de existência com os seus 50 bombos e 50 caixas de rufe. As ruas pouco povoadas parecem acordar à medida que se ouve o "tom tom tom, tom, tom tom tom" dos tambores batidos furiosamente pelos braços jovens de rapazes e raparigas. De vez, em quando- inevitável-dispara um alarme de automóvel. Marcando o ritmo, os jovens oscilam sempre para a direita e para a esquerda e acompanham a batida com gritos simultâneos de "oeh, eoh".
"OLHA TANTOS BOMBOS!"
Por alturas da Rua do Chão da Feira, a expressão no rosto dos organizadores é de felicidade. Afinal, não é todos os dias que se pode ter a percussão dos Tócandar a descer de forma imperial as ruas estreitas do bairro. À porta do Chapitô, até o cozinheiro vem ver o desfile e numas águas furtadas, dois homens de leste acorrem a fotografar o grupo da Marinha Grande.
"OH MY GOD!"
Os passageiros do eléctrico 28, a maioria estrangeiros, não se importam mesmo nada de esperar pela passagem do corso e divertem-se quando um mascarado lhes enfia um mar de papelinhos e serpentinas pela janela.
ALFAMA PURA E DURA
"Oh bichona, anda cá oh bichona, oh Manuela, olha o teu filho", grita uma mulher desdentada em frente a uma taberna da Rua do Vigário ao ver um rapaz de Alfama vestido de mulher, saia curta, botas altas, perna branca insinuante. "Sua bichona!"

2 Comments:

  • At 1:46 da manhã, Blogger Maria said…

    Confesso que li as duas "versões" desta crónica... e que, em ambas as leituras, senti alguma nostalgia.

    Talvez fosse, apenas... saudade de tempos idos em que, ainda, havia um Carnaval, tipicamente, português e não se importava samba e morenas de minúsculos biquinis.

    Talvez fosse, apenas... o recuperar, de memórias de menina e, de dias em que se retirava dos velhos baús as roupas, velhas e gastas, inventando-se mil disfarces...

    Talvez fosse, apenas... a constatação de que o divertimento de outrora se converteu, actualmente, em exibição pura...

    Ao ler esta crónica recordo, os bombos de Almaceda... os bailes de Carnaval... o cantar do Entrudo e, os muitos risos que provocamos quando, de porta em porta, lá íamos fazendo as mais tolas traquinices...
    Certo é que, ler estas palavras valeu por mil imagens de uma televisão que não nos mostra a nós, nem à nossa verdadeira essência, mas uma montagem fútil e, como referi, importada!

    Tudo isto para dizer que gostei... gostei de uma crónica que retracta um Carnaval simples... de um Portugal verdadeiro!

     
  • At 2:39 da manhã, Blogger NUNO FERREIRA said…

    Thanks a lot...

     

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