estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2005-02-17

Vota meu amor

- Jorge, vais votar em quem?
- Vou votar em ti.
- Vá lá, a sério, votas em quem?
- Voto no que tu quiseres se me deixares fazer aquela coisa hoje à noite.
- Parvo, estou farta de tentar ter uma conversa a séria contigo
- O que é queres que eu te diga? Soam-me todos a falso. Bom, talvez vote Sócrates, pela mudança...
- Mas ele é de plástico, vazio, sem ideias...
- Então voto...sei lá...passa-me a tabulete de chocolate...por ti voto no Santana.
- Odeio o Santana. Ainda hoje estou convencida que foi ele que destruiu o casamento da Paula.
- Que parvoíce, estamos a falar de política. A vida dos candidatos não é para aqui chamada.
- Mas é a da Paula. Fartou-se de sofrer.
- A Paula imagina coisas, a Paula toma comprimidos. Quando foi a última vez que ela se declarou a ti?
- Jorge...estás proibido de contar essa história a quem quer que seja!
- Ok. Vamos voltar à política. Aprecio um bocado a honestidade do Jerónimo de Sousa
- E a rouquidão?
- Chupa rebuçados Dr Baiard ou Banard ou que raio era aquilo que o meu avô tomava
- E o comunismo? E Cuba e a Coreia do Norte?
- Pára! Pára! Pára! Então em quem voto eu?
- O Louçã?
- O Louça é um beato, é a esquerdazinha das virtudes...
- Andas a ler o Pulido Valente
- Sei lá o que te diga, eu não percebo nada de política, quero é que o Benfica ganhe o campeonato e...
- A minha mãe vai votar Paulo Portas
- A tua mãe votava na Irmã Lúcia se ela ainda estivesse viva e concorresse.
- Vê lá como é que tu falas da minha mãe!
- Falo com a mesma liberdade com que tu falas na minha
- A minha mãe não aspira o chão da nossa casa, da nossa casa, repito, às duas da manhã...por falar nisso, bem podia pagar a conta da electricidade deste mês
- O quê? Que conversa é essa?
- Não é conversa, é esse papel que está aí na tua mesinha da cabeceira. São 48 euros até ao dia 25 senão cortam-nos a luz.
- Merda, perdi a vontade de votar.

1 Comments:

  • At 10:18 da tarde, Blogger Maria said…

    :)
    Foi impossível não sorrir, ao ler este texto que retrata com ironia e apurado humor a classe política.

     

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