estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2006-10-04

Posted by Picasa A partir das 19h00, a maioria dos turistas deixava a praia e as piscinas e começava a concentrar-se em grande número na zona do bufett e do auditório ao ar livre. As cadeiras em exposição, na foto, pertencem ao bar defronte ao auditório e que servia de uma espécie de rectaguarda para quem não queria estar tão perto do palco ou simplesmente não conseguia lugar à frente. Que tipo de pessoas ali encontravamos? Toda a gente: Ingleses cor de lagosta com tatuagens nos ombros e t-shirts da Union Jack; italianos de gel no cabelo e camisas havaianas; rednecks que dir-se-iam saídos de um documentário sobre um presídio no Alabama, com aqueles bonés de pala bem espetada e suíças à malandro sulista; jamaicanos e jamaicanas emigrantes nos Estados Unidos, alguns dos quais pisavam o solo vagarosamente, assentando um pé primeiro e depois o outro, estilo elefante na selva. As jamaico-americanas pareciam saídas de Brooklyn, óculos escuros presos ao cabelo e a pedir ao balcão dos bares: "Hooney, get me a Bloody Mary, will you?"
Havia também muitos casais com bébés em carrinhos. O auditório à noite, com os seus programas para toda a família, serviam às mil maravilhas quer para os pais de pequenos rebentos que do bufett seguiam para ali e dali directamente para o quarto quer para os pais de adolescentes que esperavam ansiosamente pela abertura da discoteca. Esta tinha teóricamente a entrada reservada a maiores de 16 anos mas ninguém fazia caso. Tinha o original nome de Pacha e qualquer semelhança com um frigorífico era pura coincidência.
Pelos bares do hotel cirandavam também as loiras com os seus gigolos jamaicanos. Alguns deviam passar lá a vida porque os empregados já os conheciam. Uma noite cumprimentei um, um negro possante mas já a caminho dos 60 e cujo mercado era mais o da meia-idade: "So, I notice you are famous here!" O homem arregalou muito os olhos, deixou a dentadura branca brilhar e respondeu: "Ohhh...., oh yes I am, yes I am". Ainda tive direito a uma tapa amigável nas costas antes de o ver encher o prato de frituras.
A melhor e mais memorável das noites foi quando decidimos comer no exterior da sala do bufett. Por vezes, esta estava muito cheia e a alternativa era vir cá para fora, para a noite tropical, marcar uma mesa e esperar que aparecesse um empregado. Marquei a mesa com o boné e parti, prato na mão em busca de comida. Quando voltei, não havia mesa e apenas duas das quatro cadeiras se mantinham no lugar. Olhei em volta e vi de um lado um casal de loiros esturricados que sorriram e continuaram a mastigar. Do lado esquerdo, aí sim, estava a razão do desaparecimento da mesa e das cadeiras. Instalara-se ali uma família extensa de italo-americanos que pareciam saídos da série Sopranos, a comerem pizzas com as mãos grossas e grandes e a boca aberta, os homens de ombros largos, calvos e camisas tropicais a ameaçar as crianças de porrada. Ah e havia aindas os de leste, as russas, os arménios a viver nos Estados Unidos...