estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2007-12-21

BOSS EM PARIS

PARIS BERCY, 17 de Dezembro de 2007

Devo dizer-vos que devido ao intenso frio que se fazia sentir em Paris, não tenho deste concerto a percepção nítida e objectiva que tenho de todos os que já vi. Tudo por causa de uma garrafa de cognac que comprei para aguentar as horas de espera na fila. O meu amigo Renato diz que viu nevar e realmente também me pareceu vislumbrar a flutuação de umas coisinhas brancas por cima das cabeças dos cerca de 600 que esperavam para ir para o pit.
A espera foi enorme. Cheguei às 9h30, já lá estavam umas 200 pessoas. Houve uns tipos (loucos) que dormiram junto a Bercy com sacos camas e termos. Fui o 233 e percebi que a lista tinha começado a ser efectuada na noite anterior por um italiano. Havia montes de italianos mas também gregos, holandeses, americanos, espanhois, ingleses. Fiquei sossegado quando me disseram que iam caber 600 na frente do palco.
De qualquer forma, e para não variar, os franceses da organização privilegiaram pela arrogância, criando uma grande confusão quanto às entradas. Diziam que se estavam a borrifar para as bandas que um tipo do Springsteen nos ia colocando e mandaram avançar gente com banda e gente que tinha chegado horas depois. Valeu a firmeza do Jerry ou Jeff (?), um americano road manager do Boss cinco estrelas que negociou duramente com um francês de cabelo cortado à escovinha e cara fechada. Percebi que a nossa batalha estava ganha quando vi o francês receber instruções ao telemovel e ir-se embora com cara de poucos amigos.
Por volta das 13h00, deram-nos instruções para regressarmos às 16h00, aí correu tudo muito bem mas a espera foi glacial. Lá fui distribuindo generosas doses de cognac a amigos que fiz na fila, a saber: um bretão, um casal de holandeses, um americano de New Jersey, etc.
Quando corri para dentro do pavilhão e me apercebi que estava na primeira fila, tendo apenas à minha frente os "loucos" que haviam dormido ao relento, parecia que estava a viver um sono. Ao pé de mim, ansiosos, estava um jovel casal de Nápoles, um puto inglês de 14 anos que pulou comigo o tempo todo e que tinha a mãe na bancada, o "meu amigo" de New Jersey e italianos, muitos italianos atrás de mim.
O começo foi um estrondo. O Boss não deu tréguas a Paris, mesmo sabendo que aquele não é o melhor público da Europa mas a sequência foi tão fantástica que não deu tempo para respirar: Radio Nowhere, No Surrender, Night, Lonesome Day...Quando dei por ela estava a suar por todos os poros abraçado ao puto inglês que dois dias depois ia assistir ao show de Londres. Olhava para as bancadas e toda a gente estava aos pulos, incluindo os que tinham assento por trás da banda.
O meu lugar não era exactamente ao centro, mas mais à esquerda, o que me permitiu zarpar uma ou duas vezes pra buscar bijecas sem problemas. Durante o "Livin' in The Future", o homem pairou à nossa frente, ainda pensei que lhe conseguiria tocar mas who cares? Maybe next time!
Long Walk Home e a sequência Jungleland-Born To run e Dancing in The Dark deu cabo de mim. De tal forma que já estava de rastos quando chegou American Land e Santa Claus. Foi a primeira vez que assisti ao vivo ao "Santa Claus is Coming to Town", magnífico...