estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2005-05-20

VAMOS TODOS SURFAR A ONDA DO JACK JOHNSON

O Coliseu dos Recreios vai receber sábado à noite o surfista da viola acústica, da praia e das ondas, do alto astral. Promete ser uma noite de paz, amor e isqueiros


Um tipo simples com uma guitarra acústica a cantar num bar de praia à luz de umas velas. É essa a imagem que Jack Johnson não se importaria que retessem dele, o surfista hawaiano que um dia gravou um disco produzido por Ben Harper e entrou na vaga dos artistas “boa onda”. Sem a espiritualidade, a voz e o virtuosismo de Ben Harper, Jack Johnson é alguém que nunca encarou verdadeiramente uma carreira musical a sério mas que se deixou levar na onda do sucesso do primeiro disco, “Brushfire Fairytales” (2001).
A folk impregnada de reggae de Jack é tranquila, um pouco ao estilo do veterano James Taylor, por vezes com pinceladas de Ben Harper (“Never know”) ou da folk mais agressiva de Mason Jennings mas quase sempre largando uma aura de bem estar e positividade à sua volta.
Influências assumidas: O bluesman Taj Mahal, Otis Reding, Bob Dylan, Neil Young. Apesar de por uns tempos, na adolescência no Hawai, Jack ouvir Jimi Hendrix e bandas punk como os Bad Religion, Fugazi ou Minor Threat.
Jack Hody Johnson, o mais novo de três filhos, nasceu em Oahu, no norte do Hawai, filho do profissional de surf Jeff Johnson, em 1975. “Ele levava um vida simples”, contou Jack há três anos ao Chicago Tribune, “ e a vida dele fez-me ver que não é preciso muita coisa para se ser feliz”.
Jack Johnson iniciou-se no surf profissional aos 14 anos mas teria de abandonar a promissora carreira aos 17, depois de ter embatido contra uma barreira de corais. Para além de ter sofrido bastantes golpes, perdeu os dentes da frente e parando de surfar durante uns meses, começou a dedicar mais tempo ao hobby da guitarra, que mantinha desde os 14 anos. No liceu, a local Kahuku High School, tocou numa banda punk, os Liver Chiken, para a qual compunha mas onde apenas tocava guitarra.
De qualquer forma, uma carreira profissional de surf era coisa que Jack encarava com a mesma desconfiança com que hoje encara a faceta mais comercial do seu eu musical. “Eu praticava surf mas sem querer compromissos e com a música, é a mesma coisa. Simplesmente, a música mal é partilhada, deixa de ser nossa. O surf é algo muito puro, quero guardá-lo só para mim”, explica.
Johnson só deixou o Hawai e mesmo assim, trocando-o as ondas da ilha pelas da Califórnia, para estudar e formar-se em cinema em Santa Barbara. Em 96, conheceu o produtor Emmet Malloy que se tornou seu manager.
Foi com “Brushfire Fairytales” (2001), produzido por Ben Harper, que surge a tocar lap steel e a oportunidade de fazer a primeira parte dos concertos de Ben, que Jack Johnson começou a ganhar atenção. Até então, Jack era conhecido na comunidade surfista e entre os que rodavam filmes sobre surf e passava grande parte do tempo a tocar em pequenos clubes para onde se dirigia com os outros músicos numa pequena carrinha.
“Eu comecei a pegar na guitarra para tocar em churrascos ao ar livre. Cantava canções do Jimmy Bufett, do Van Morrison, do Cat Stevens. Mais tarde, os meus pais compraram-me uma guitarra eléctrica”, conta.
Mesmo quando começou a ter de se ausentar mais tempo do Hawai para andar em tournée com Ben Harper, Jack nunca pensava na música como uma carreira a sério. “Eu pensava em ir em tournée durante três meses e ver se gostava daquilo e se não tirasse prazer do que estava a fazer, continuaria a fazer filmes sobre surf”, disse ao site Launch.
Por vezes, Jack confessa que está no palco e só pensa no surf. “É raro mas já me aconteceu estar no meio de um espectáculo, olhar para aquelas cabeças todas e pensar que aquele era o último sítio onde queria estar. Ás vezes, a minha cabeça está longe, está no surf, surfar com os amigos”, explica.
Em 2003, dois anos depois de se expor, a si, à sua viola e à sua tábua de surf, Jack Johnson regresou com “On and On”, produzido por Mario Caldato Jr. (Beastie Boys, Jon Spencer Blues Explosion) mas sem grandes alterações no som: A mesma linha tranquila acústica, que só se altera por vezes, quando alinha um pouco na folk interventiva de Mason Jennings, uma reconhecida influência, em canções como “Gone” ou “Traffic in the sky”.
No final de 2003, Jack Johnson lançou finalmente o cd com a banda sonora de “Thicker Than Water”, um documentário sobre surf realizado uns três anos antes juntamente com os companheiros das ondas Chris e Dan Malloy.
Com Jack, surgem na banda sonora G. Love & Special Sauce, The Meters, Finley Quaye. Os temas de Jack Johnson alinham na mesma linha acústica de sempre (“Moonshine”, “The Cove”, “Holes to heaven”) com sons de praia e banhistas por trás enquanto G. Love traz um pouco de blues que poderíamos apelidar de blues pacífico ou blues “boa onda”, bem exemplificado em “Rainbow”. Mesmo o som mais soul /funk assente nos sintetizadores de Finley Quaye parece caminhar entre as areias da praia, o horizonte azul avistado entre as dunas.
“In Between Dreams”, lançado recentemente, é talvez o álbum mais apelativo, mais dançável e comercial de Jack Johnson, começando com a folk muito à James Taylor “Better together”, passando pela pop/ reggae de “Good People”, o funk de “Staple it together” e acabando com o folk/pop/reggae de “Never know” que concerteza fará dançar muita gente amanhã no Coliseu. Outros temas que os fãs identificarão facilmente será, sem dúvida, a melosa “Constellations”, ou a amorosa “Banana Pancakes”, na qual o autor pergunta à amante se não percebe que vai continuar a chover, lhe pede para não atender o telefone e lhe explica que o melhor é ficarem em casa, na preguiça, a comer panquecas de banana.
Algo que Jack nunca largará, além da viola, serão as praias e o surf. Quando vai em tournée, ele e o baterista levam sempre a prancha atrás. “Eu escrevo muita coisa durante as viagens que faço para surfar e isso porque o surf dá-te tempo para pensar, liberta-te a mente de outras coisas”, explica. “O surf dá-me equilíbrio e positividade”.

Sábado, dia 21, Coliseu dos Recreios
21h00

1 Comments:

  • At 2:55 da manhã, Anonymous Anónimo said…

    Engraçado que qd comecei ler o post
    pensei em Ben Harper. Vi-o no Coliseu. E elegi-o como um dos 25 autores que mais me marcaram nos últimos 25 anos num artigo que escrevi para um jornal online.

     

Enviar um comentário

<< Home