estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2008-01-29

O fogareiro

Afasta lá o fogareiro!

Rua da Palma: A camioneta de mudanças de caixa aberta ultrapassa repentinamente o táxi sem sinal nem aviso prévio. À minha frente, o toldo da parte de trás esvoaça enquanto o taxista trava a fundo e pragueja: “Grande camelo, ‘tás na corrida, logo de manhã!” A carrinha desaparece por momentos engolida pelo tráfego congestionado da manhã do Martim Moniz mas o taxista não desarma. Alcança-a em plena Rua dos Fanqueiros, junto à porta de uma loja. Roda rápidamente a maçaneta da porta e dispara: “Andas a dormir? Vê lá se acordas, oh palhaço!” O discurso tem de ser curto e incisivo, que mais tráfego se adivinha pelo vidro coberto de chuviscos da traseira. O camionista debruça-se quase deitado sobre o colega sentado no lugar do morto e responde em bom português: “Afasta lá o fogareiro, oh animal!”