estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2004-09-10

My darkened corner

Habituei-me há muito a ouvir country e blues. Têm as letras mais desgraçadas deste mundo. Quando estás down, sentes que não te encontras só. Está ali o Johnny Cash a cantar "At my door the leaves are falling, a cold wild wind has come, sweethearts walk by together and I still miss someone. I go out on a party and look for a little fun but I find a darkened corner because I still miss someone. Oh, no I never got over those blues eyes. I see them every where. I miss those arms that held me. When all the love was there I wonder if she's sorry. For leavin' what we'd begun. There's someone for me somewhere and I still miss someone".
Por vezes, também sinto necessidade do meu "darkened corner", o lugar onde ninguém te vê e podes expiar toda a tristeza que te invade. Ultimamente sinto que há demasiadas vozes na cidade, demasiados carros e demasiado atropelo. Sinto falta da trilha poeirenta que te leva, no fundo dos fundos do Maranhão, ao Poço Azul e à Cachoeira de Santa Bárbara, à beleza bíblica da cachoeira da Pedra Caída. Na cidade não há pôr do sol como aquele da Fazenda do Carmo, a planura molhada da Ilha do Marajó até ao infinito, as redes balouçando na varanda e a gente a cavalo, o sol a desfazer-se em sangue de um lado, uma lua gorda, branca e leitosa a nascer do outro lado, o latir dos cães a ladrar aos búfalos como único sinal de stress.
Regresso à cidade e sinto-me atropelado. Alguém a tentar ultrapassar-me pela direita com um piscar de olho malandro e sedutor. Outro alguém a chamar-me de amigo para obter proveitos. Uma cidade cheia de vozes que me risca e arranha o cérebro como buzinas que nunca se calam. Na selva, as cobras fogem-te dos pés ao mínimo pisar das botas na folhagem. Na cidade, nunca sabes onde elas estão. Por isso, às vezes sinto necessidade do "darkened corner" de onde observo os jogadores, os lances, onde vejo quem dá mais, quem vai levar o bouquet da noiva ou a cereja do bolo, quem vai correr à frente dos outros para ficar com a primeira cadeira.
Mas na cidade, eu sei, também tenho os meus "blood brothers" e sei onde eles estão. Obrigado Rui, cada viagem de trabalho contigo é um desabafo e obrigado pela forma como ontem me estendeste os lenços de papel, como dizendo: "Take it my blood brother, take all you need, no need to suffer alone, I'm here brother..."Obrigado, Inês, pela preocupação de mãe de 24 anos. E Obrigado ao Ponto, do Blog Ponto & Vírgula. Não esperava. Thank you brothers, I know where you are...




1 Comments:

  • At 8:23 da tarde, Blogger Simplesmente 20 =) said…

    Espero é que dia 30 de Outubro saias do teu "darkened corner", e venhas-te abanar ao som do Brasil com a bela Ivete. Espero-te lá no meio de multidão, com um grande sorriso ;)

    De uma leitora assídua do teu blog
    ---> A sobrinha

     

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