estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2005-02-01

Porque somos tantos

"Havia coisas extraordinárias. Quando o Benfica jogava, púnhamos os altifalantes virados para a mata e, assim, não havia ataques.Parava a guerra?Parava a guerra. Até o MPLA era do Benfica. Era uma sensação um bocado estranha porque não faz sentido estarmos zangados com pessoas que são do mesmo clube que nós. O Benfica foi, de facto, o melhor protector da guerra. E nada disso acontecia com os jogos do Porto e do Sporting, coisa que aborrecia o capitão e alguns alferes mais bem nascidos. Eu até percebo que se dispare contra um sócio do Porto, mas agora contra um sócio do Benfica?Não vou por isso na entrevista...Pode pôr. Pode pôr. Faz algum sentido dar um tiro num sócio do Benfica?"
António Lobo Antunes à Revista "Visão", 2003