estradas perdidas

Atrás de casa, encoberta por tufos de erva daninha, silvas e bidões abandonados, o comboio de janelas iluminadas vinha das Quintãs e silvou depois do túnel em curva, em direcção a Aveiro. Ali ao lado há uma estrada, a minha primeira estrada. Mulheres e homens cruzam-na impelindo teimosamente os pedais das bicicletas. Junto à vitrine de um pronto-a-vestir lê-se "Modas Katita". De uma taberna, saem dois homens que se dirigem para duas Famel-Zundapp. Estrada perdida.

2004-06-01

O Joseney

Encontrei o Joseney no Rock In Rio. Encontro sempre o Joseney nas esquinas da vida, aqui e ali, quando menos espero. E desaparece também com a mesma rapidez com que bebíamos caipirinhas juntos. Está mais velho, tem o rosto encarquilhado e enrugado e substituíu o ridículo rabo de cavalo pelo cabelo à Beatle de risco ao meio. Esqueci-me de lhe perguntar se ainda ouve Raul Seixas. Falei tanto quando o vi que o homem ía-se mijando pela pernas abaixo. "Cê vai aonde? Espera por mim, tenho de mijar". O Joseney partilha comigo a mesma paixão pelo norte do Brasil, a mosquitada e tudo o que acaba em "ada". Em Setembro vai tirar três meses para viajar do Maranhão lá para cima. Perguntei pelo Edmundo, o homem de Dourados, Mato Grosso do Sul, ex-Polícia Militar em Altamira, Pará, ex-contrabandista de arma entre o Paraguai e o Matogrosso, há vários anos o homem que roda o churrasco na churrasqueira do Robson. "Cê sabe que o Edmundo não fala mais comigo? É verdade. Quando veio a Portugal o Robin William, eu tinha um ingresso a mais, aí perguntei pro Edmundo se podia levar a mulher dele, ela estava toda entusiasmada. Aí, ele disse que sim, ela foi mais umas meninas, adoraram...Aí, ahahah, a mulher chegou a casa contando maravilha, que o show fora fantástico...no dia seguinte, o Edmundo brigou comigo, que eu não era homem de palavra, que nunca mais falava comigo. Tá vendo isso?" Oh, toma cuidado Joseney, o Edmundo contou-me uma vez como aprendeu em Altamira a desmontar uma metralhadora de olhos vendados e como comprava e vendia arma entre o Paraguai e Dourados. Não...mas o Edmundo é boa gente, sempre com um sorriso com os lábios enquanto me enchia mais uma "tulipa" de cerveja: "Esse aí é portuga malandro, conhece mais Brasil q'a gente. Conta aí quando cê foi ao Boi Bumbá..."
Adiante. O Joseney deixou-me a meio da chinfrineira do espectáculo dos Evanescence para ir mijar outra vez e nunca mais voltou. Hei-de voltar a encontrá-lo nas esquinas da vida, distribuindo folheto de publicidade ou a trabalhar com uma produtora de televisão. Sabiam que ele ajudou a montar a primeira casa do Big Brother? Foi o Joseney, de Curitiba, Paraná mas vacinado em mosquito pela universidade natural de Porto Velho, Rondónia.