2008-12-15
2008-11-17
ESPERANÇA NUM MUNDO MELHOR
Out here the nights are long the days are lonely
I think of you, and, I’m working on a dream
I’m working on a dream
Now the cards I’ve drawn is a rough hand darlin'
A straight and I'm back in.... and I’m working on a dream
I’m working on a dream, I’m working on a dream,
Though sometimes it feels so far away
I’m working on a dream, and I know it will be mine someday
Rain pouring down I swing my hammer
My hands are rough from… working on a dream
I’m working on a dream I’m working on a dream,
Though trouble can feel like it’s here to stay, I’m working on a dream,
Well our love will chase the trouble away I’m working on a dream,
Though it can feel so far away I’m working on a dream,
Our love will make it real someday
The sun rises up, I climb the ladder
A new day breaks and… I’m working on a dream
I’m working on a dream I’m working on a dream
I’m working on a dream Come on.... I’m working on a dream,
Though it can feel so far away I’m working on a dream,
Our love will make it real someday I’m working on a dream,
Oh it can feel so far away I’m working on a dream,
And our love will make it real someday
2008-09-15
2008-09-14
PORTUGAL A PÉ
Estou no Portugal a Pé (http://portugalape.blogspot.com/) e sem tempo para postar aqui.
Abraços
Nuno
nunocountry@gmail.com
Abraços
Nuno
nunocountry@gmail.com
2008-08-20
2008-06-17
UMA TARDE COUNTRY APRESENTA
NANCI GRIFFITH, JIMMY MARTIN, LUCINDA WILLIAMS,THE MAVERICKS,DWIGHT YOAKAM, BUCK OWENS, MATRACA BERG,BONNIE RAITT, JOHN PRINE, CHRIS KNIGHT,JOHN MELLENCAMP, CARLENE CARTER, EMMYLOU HARRIS E MARTINA MCBRIDE
SÓ MAIS UM COPO
"JUST ONE MORE"
Put the Bottle on the Table
Let it Stay there Till I'm not Able
To See your Face in ev'ry Place that I Go
I've been Sitting here so Long
Just Remembering that you are Gone
Well, One More Drink of Wine
Then if you're Still on my Mind
One Drink, Just One More and then Another
I'll keep Drinking, it won't Matter
I'll just Remember that I Once had Her
I don't Know why I Sit and Cry ev'ry Day
I've been trying to forget, But I Havent Stopped it Yet
Well, One More Drink of Wine
Then if you're Still on my Mind
One Drink, Just One More and then Another
Put the Bottle on the Table
Let it Stay there Till I'm not Able
To See your Face in ev'ry Place that I Go
I've been Sitting here so Long
Just Remembering that you are Gone
Well, One More Drink of Wine
Then if you're Still on my Mind
One Drink, Just One More and then Another
"A vida é o que te está a acontecer enquanto estás a fazer planos para outra coisa qualquer"
Sam Shepard, "O Grande Sonho do Paraíso"
Sam Shepard, "O Grande Sonho do Paraíso"
2008-06-14
ALGARVE A PÉ IV
Chegara a Silves- a pré-histórica, a romana, a mourisca, ex-capital do Algarve e da cortiça, pela ponte velha- um pé elástico na perna direita, a mochila aos bamboleios, o cabelo em desalinho, irritado com a corrida insensata das viaturas contra os sinais de abrandamento da velocidade. Procurara abrigo numa tasca tristonha a tempo de assistir a um indivíduo de plástico na cabeça a saír de garrafa sumol cheia de vinho branco debaixo do braço. “Aguardente de medronho?”, perguntara-me a dona em azedume, “isso é muito caro. Você não vai querer pagar dois euros pela aguardente...e só posso encher até aqui”. Marcou um risco com os dedos. “E vá lá que eu quero fechar...”
Depois de cirandar pelas ameias cor de chocolate do castelo e de escutar Rui, o acordeonista cego, umas cisternas e alguns achados arqueológicos mais tarde, uma visita apressada às cavalariças onde funciona a GNR local, perguntara-me o que seria preciso para alguém reparar o telhado da Sé. “Está todo desdentado. A câmara não tem dinheiro, o Estado diz que também não. Quando caír uma telha em cima de um turista estrangeiro a ver se não aparece o dinheiro”, comentava uma residente.
Farto de ouvir falar em doenças, nos últimos três falecidos na cidade e na meia da Madeleine Mcain “encontrada” na Barragem do Arade, bati em retirada de um café e refugiei-me na barbearia do Chico “Cadela”, um pedaço da velha Silves incrustado na cidade dos turistas: “O meu primeiro mestre foi o Joaquim Baião, o segundo foi o Tomé Calhau. Sou do tempo em que Silves tinha 16 barbearias, quatro equipas de futebol e muita cortiça. Trabalhava as manhãs e as tardes”. Agora, ninguém para cortar o cabelo a cinco euros ou fazer a barba a três. “Vai tudo às cabeleireiras. Já me aborrece isto. É uma vida marafada”.
Deixo Chico, aliás Francisco António, 67 anos, nascido na freguesia rural de Falacho, entregue às inquietações de barbeiro solitário- “ estou sózinho, elas só querem dinheiro”- e faço-me aos 17 quilómetros de laranjais que separam Silves de São Bartolomeu de Messines, por entre bermas quase inexistentes ou cobertas de arbustos. Escala: Taberna da Norinha, em Norinha, onde o pastor Paulo Duarte, 31 anos, enrola tabaco numa mortalha e assume as despesas da conversa. “Já trabalhei na construção mas aqui é que eu gosto de estar, no campo. Não gosta do campo?” Compro uma mini e deixo-me ficar sentado, na esplanada da Taberna da Norinha, observando os carros atravessam apressadamente a EN24 em demanda de Silves e a civilização. “Em ficando aqui, eu mostro-lhe as minhas ovelhas”, promete Paulo, o pastor.
Depois de cirandar pelas ameias cor de chocolate do castelo e de escutar Rui, o acordeonista cego, umas cisternas e alguns achados arqueológicos mais tarde, uma visita apressada às cavalariças onde funciona a GNR local, perguntara-me o que seria preciso para alguém reparar o telhado da Sé. “Está todo desdentado. A câmara não tem dinheiro, o Estado diz que também não. Quando caír uma telha em cima de um turista estrangeiro a ver se não aparece o dinheiro”, comentava uma residente.
Farto de ouvir falar em doenças, nos últimos três falecidos na cidade e na meia da Madeleine Mcain “encontrada” na Barragem do Arade, bati em retirada de um café e refugiei-me na barbearia do Chico “Cadela”, um pedaço da velha Silves incrustado na cidade dos turistas: “O meu primeiro mestre foi o Joaquim Baião, o segundo foi o Tomé Calhau. Sou do tempo em que Silves tinha 16 barbearias, quatro equipas de futebol e muita cortiça. Trabalhava as manhãs e as tardes”. Agora, ninguém para cortar o cabelo a cinco euros ou fazer a barba a três. “Vai tudo às cabeleireiras. Já me aborrece isto. É uma vida marafada”.
Deixo Chico, aliás Francisco António, 67 anos, nascido na freguesia rural de Falacho, entregue às inquietações de barbeiro solitário- “ estou sózinho, elas só querem dinheiro”- e faço-me aos 17 quilómetros de laranjais que separam Silves de São Bartolomeu de Messines, por entre bermas quase inexistentes ou cobertas de arbustos. Escala: Taberna da Norinha, em Norinha, onde o pastor Paulo Duarte, 31 anos, enrola tabaco numa mortalha e assume as despesas da conversa. “Já trabalhei na construção mas aqui é que eu gosto de estar, no campo. Não gosta do campo?” Compro uma mini e deixo-me ficar sentado, na esplanada da Taberna da Norinha, observando os carros atravessam apressadamente a EN24 em demanda de Silves e a civilização. “Em ficando aqui, eu mostro-lhe as minhas ovelhas”, promete Paulo, o pastor.
2008-06-08
ALGARVE A PÉ III
A Praia da Rocha pode ser um local bem solitário numa noite fria de Março. Que o diga Diana Rosa, uma figura esguia, os cabelos castanhos caindo sobre os ombros, de cuja voz saem clássicos de todos os tempos e estilos, canções para o jantar. A sala, uma trintena de mesas de toalhas brancas a meia luz, é de um vermelho feroz: Holofotes encarnados, músicos de camisas encarnadas, abajours vermelhos, cadeiras e guardanapos encarnados. De vez em quando, ouvem-se umas risadinhas por detrás das pesadas cortinas encarnadas e alguém espreita a sala. São as jovens do espectáculo de "celebração da mulher", "La Femme", celebrando as suas próprias vidas antes de actuarem.
Palmeiras espreitam das vidraças enormes junto às quais jantam os únicos comensais. De cada vez que Diana Rosa e os Supremos terminam um tema, abate-se sobre o salão do Hotel Algarve Casino um silêncio constrangedor.
Diana sola mais uma e uma vez. O casal abandona a sala. Ao fim de dois copos de "Romeira" tinto, abalanço-me a bater as palmas. Diana solta um "obrigado" melancólico, o primeiro de muitos porque não me cansarei de fazer "clap, clap" com a força braçal de um desesperado.
Enebriado com a regalia de um salão de casino só para mim, aplaudo os peitos redondinhos e as pernas esguias, brancas e saudáveis das dançarinas do espectáculo que uma voz masculina anuncia: "Senhoras e senhores, eis um tributo às extraordinárias, dominantes, altruístas e assertivas mulheres!"
À meia noite, ainda lá pairo, náufrago na vermelhidão do salão-restaurante, quando me apercebo que a banda só parará de tocar quando me for embora. Bato em retirada para cuidar das pernas e dos pés sofridos de uma caminhada por entre as conchas da Meia Praia, os windsurfers e apanhadores de marisco da ria do Alvor, as pedras do caminho de ferro no Vale da Lama, as laranjeiras de Figueira, o golfe da Penina, as falésias da Praia dos Três Irmãos.
Lagos, a liberal, onde assentara praça no "Three Monkeys", aquele tipo de bar onde Diana e os Supremos acabariam a cantar "Should I Stay Or Should I Go" após umas rodadas de shots e cervejas, ficara para trás há muito. A noite caíra sobre o Alvor e eu perdido entre um dédalo de moradias brancas e fantasmagóricas de um aldeamento fantasma. Pela frente, esperar-me-iam ainda rotundas e fileiras de torres vazias, um ou dois apartamentos iluminados numa vastidão de 15, 20 pisos até ao casino. "Vais dormir na praia?", perguntara-me um solitário segurança romeno saído de um contentor. A Praia da Rocha pode ser um local bem solitário numa noite fria de Março.
Palmeiras espreitam das vidraças enormes junto às quais jantam os únicos comensais. De cada vez que Diana Rosa e os Supremos terminam um tema, abate-se sobre o salão do Hotel Algarve Casino um silêncio constrangedor.
Diana sola mais uma e uma vez. O casal abandona a sala. Ao fim de dois copos de "Romeira" tinto, abalanço-me a bater as palmas. Diana solta um "obrigado" melancólico, o primeiro de muitos porque não me cansarei de fazer "clap, clap" com a força braçal de um desesperado.
Enebriado com a regalia de um salão de casino só para mim, aplaudo os peitos redondinhos e as pernas esguias, brancas e saudáveis das dançarinas do espectáculo que uma voz masculina anuncia: "Senhoras e senhores, eis um tributo às extraordinárias, dominantes, altruístas e assertivas mulheres!"
À meia noite, ainda lá pairo, náufrago na vermelhidão do salão-restaurante, quando me apercebo que a banda só parará de tocar quando me for embora. Bato em retirada para cuidar das pernas e dos pés sofridos de uma caminhada por entre as conchas da Meia Praia, os windsurfers e apanhadores de marisco da ria do Alvor, as pedras do caminho de ferro no Vale da Lama, as laranjeiras de Figueira, o golfe da Penina, as falésias da Praia dos Três Irmãos.
Lagos, a liberal, onde assentara praça no "Three Monkeys", aquele tipo de bar onde Diana e os Supremos acabariam a cantar "Should I Stay Or Should I Go" após umas rodadas de shots e cervejas, ficara para trás há muito. A noite caíra sobre o Alvor e eu perdido entre um dédalo de moradias brancas e fantasmagóricas de um aldeamento fantasma. Pela frente, esperar-me-iam ainda rotundas e fileiras de torres vazias, um ou dois apartamentos iluminados numa vastidão de 15, 20 pisos até ao casino. "Vais dormir na praia?", perguntara-me um solitário segurança romeno saído de um contentor. A Praia da Rocha pode ser um local bem solitário numa noite fria de Março.
ALGARVE A PÉ II
"Podes me dizer o que vem nessa mensagem?" A carrinha branca vinda das bandas da Barragem da Bravura acordara o vale das laranjeiras com buzinadelas frementes, de tal maneira que a gata Nina e a filhota correram rua acima acreditadas de que era o homem do peixe. Puro engano. Saíu-nos este passarão a vender roupa desde Silves. "É que eu não sei ler. Lê lá..." Caixa de mensagens, botão da esquerda, carregar ok: "hum, diz aqui..."
Pressenti o homem da camisa das riscas aberta no peito roer por dentro de ansiedade: "Leia, leia lá..." Diz que...oh embaraço... (leio em voz baixa para as mulheres não escutarem): "Oi lindo, queres vir ter comigo, se quiseres liga o 036..." O homem ri, brilham-lhe os olhos esverdeados e ao rir escancara a boca desdentada: "Eh lá, mas isso é lá de cima. Faz-me só mais um favor, apontas aí o número?
Recebera o vale perdido de Romeiras como uma uma benção depois de quilómetros de Espinhaço de Cão, uma serpente quente e crua de asfalto trepando desde Aljezur entre fatias de xisto, a monotonia do eucaliptal e o discurso desencantado dos serranos: " Se isso me continuar, abalo também. Não há trabalho. Um moço aqui da aldeia vai vender o carro e a casa. Isto em morrendo os velhos, não fica aqui ninguém", desabafara um homem junto à gasolineira de Marmelete.
Romeiras, a verde, soou-me a "Música No Coração": O som da água na ribeira, o ladrar de um cão ao longe, um galo equivocado em relação à hora do despertar, a voz de uma criança seguindo um mulher de bata vestida: "queres mais palha, queres?"
De repente, um cão chamado Tavares, um homem de foice na mão, uma mulher escondida atrás de um balcão na penumbra, um bailarico de moscas rodopiando no centro da sala branca despida. "Essas fotos são para quê? Porque é que fotografou a minha casa? E está escrevendo sobre o meu café? O senhor desculpe, acho estranho, costuma-se pedir autorização primeiro..."
Uns cem metros à frente, outro café: "Oh, aquilo é gente que desconfia de tudo". A Nina e a cria seguem a idosa de chapéu de palha enquanto esta acende o lume, corta as batatas, assa os frangos. Nina é cega de um olho mas mais atenta às carrinhas de venda que um prescrutador de baleias do Pico. À segunda é de vez, é a Renault do homem do peixe, jogando dois carapaus no cimento. "Atão Nina? Sabe bem, não sabe?"
Uns quinze quilómetros de deserto e desaguo em Odiáxere, encadeado pelos faróis dos camiões, as buzinadelas, as travagens junto aos semáforos da EN 125. No restaurante de estrada "A Choupana", todos têm pressa. "As pessoas não percebem que só temos duas mãos...", desabafa Florita, a romena. Elsa e Abel Serôdio têm urgência de comprar peixe no viveiro de Odiáxere para vender no mercado de Albufeira: "Oh mas já ninguém compra há gente. Vai tudo aos hipermercados. Isto está muito mau".
Pelas três da tarde, o comedouro, aberto desde as 5h30, esvazia como um fole. Há tempo para o assador de leitões, João Silva exibir as tatuagens e falar de Metallica e Florita e as brasileiras Marlene e Eliane adquirirem finalmente um pouco de sossego. "Poxa, estava morrendo de fome..."
Pressenti o homem da camisa das riscas aberta no peito roer por dentro de ansiedade: "Leia, leia lá..." Diz que...oh embaraço... (leio em voz baixa para as mulheres não escutarem): "Oi lindo, queres vir ter comigo, se quiseres liga o 036..." O homem ri, brilham-lhe os olhos esverdeados e ao rir escancara a boca desdentada: "Eh lá, mas isso é lá de cima. Faz-me só mais um favor, apontas aí o número?
Recebera o vale perdido de Romeiras como uma uma benção depois de quilómetros de Espinhaço de Cão, uma serpente quente e crua de asfalto trepando desde Aljezur entre fatias de xisto, a monotonia do eucaliptal e o discurso desencantado dos serranos: " Se isso me continuar, abalo também. Não há trabalho. Um moço aqui da aldeia vai vender o carro e a casa. Isto em morrendo os velhos, não fica aqui ninguém", desabafara um homem junto à gasolineira de Marmelete.
Romeiras, a verde, soou-me a "Música No Coração": O som da água na ribeira, o ladrar de um cão ao longe, um galo equivocado em relação à hora do despertar, a voz de uma criança seguindo um mulher de bata vestida: "queres mais palha, queres?"
De repente, um cão chamado Tavares, um homem de foice na mão, uma mulher escondida atrás de um balcão na penumbra, um bailarico de moscas rodopiando no centro da sala branca despida. "Essas fotos são para quê? Porque é que fotografou a minha casa? E está escrevendo sobre o meu café? O senhor desculpe, acho estranho, costuma-se pedir autorização primeiro..."
Uns cem metros à frente, outro café: "Oh, aquilo é gente que desconfia de tudo". A Nina e a cria seguem a idosa de chapéu de palha enquanto esta acende o lume, corta as batatas, assa os frangos. Nina é cega de um olho mas mais atenta às carrinhas de venda que um prescrutador de baleias do Pico. À segunda é de vez, é a Renault do homem do peixe, jogando dois carapaus no cimento. "Atão Nina? Sabe bem, não sabe?"
Uns quinze quilómetros de deserto e desaguo em Odiáxere, encadeado pelos faróis dos camiões, as buzinadelas, as travagens junto aos semáforos da EN 125. No restaurante de estrada "A Choupana", todos têm pressa. "As pessoas não percebem que só temos duas mãos...", desabafa Florita, a romena. Elsa e Abel Serôdio têm urgência de comprar peixe no viveiro de Odiáxere para vender no mercado de Albufeira: "Oh mas já ninguém compra há gente. Vai tudo aos hipermercados. Isto está muito mau".
Pelas três da tarde, o comedouro, aberto desde as 5h30, esvazia como um fole. Há tempo para o assador de leitões, João Silva exibir as tatuagens e falar de Metallica e Florita e as brasileiras Marlene e Eliane adquirirem finalmente um pouco de sossego. "Poxa, estava morrendo de fome..."
2008-05-23
ALGARVE A PÉ
Chovera toda a santa noite. Carrapateira, a branca, acordou sob um céu pesado e invernal, uma corrente de água castanha a descer dos montes pelos paralelepípedos abaixo. Pensei: foi isto, o maldito alerta amarelo foi isto. Como a teimosia tem muita força e estava um pouco farto de ouvir falar em captura de perceves e polícia marítima, peguei na mochila, enfiei a roupa impermeável e debandei em direcção às dunas, decidido a atingir a praia da Bordeira pelo areal.
A primeira rasteira veio da própria ribeira da aldeia. A água lamacenta estendera-se num lago que me fez cirandar irritado pelo sapal e procurar contornar a pequena laguna pela estrada. Percebi rápidamente o mesmo que três jovens surfistas espanhois: O caminho em tábuas de madeira que desce para a praia, estacava abruptamente nas águas revoltosas da ribeira que cortavam as duas margens de areia como frágeis fatias de um bolo.
À saída da aldeia, já sob chuva torrencial, um alemão surgiu de uma reconstruída casa rural em pedra de xisto. “Vem para cá, não vais querer ir a pé com um temporal desses”, chamou, uma chaleira numa mão e um bocado de pão na outra. Apontei para a sua banca de abóboras com um cartão “vende-se” cruelmente fustigado pela ventania e respondi: “Também me parece que não vais conseguir vender abóboras hoje”. Sorriu, fechou a porta e eu continuei a minha caminhada insensata em direcção a Aljezur. Portugal a pé? Naquele momento, o termo apropriado seria massacre a pé. Deixara Sagres posta em sossego e sob um sol primaveril dois dias antes, homens a jogar boliche na praça central, surfistas de pernas espetadas no tablier dos jeeps, nómadas loiros beberricando cerveja junto a auto-caravanas.
Cruzara falésias brancas de calcário, o verde recortado dos carrascos competindo com o amarelo da perpétua, a das areias. Cumprimentara uma pastora do seculo XXI, observando as ovelhas à distância, o bordão dentro da viatura. Jogara calhaus rolados na Praia do Castelejo só para escutar o baque surdo nas águas, chutara pinhas, falara sozinho, cantara Jorge Palma no Miradouro da Barriga- “Eu venho do nada porque arrasei o que não quis em nome da estrada onde só quero ser feliz...
Agora, a caminhada não passava de um exercício insano, varrida por água e vento em revoadas. Parei à entrada da Bordeira, a pequena aldeia branca sob um dilúvio de chuva. Foi quando vi a senhora, num terraço. Um rio caudaloso descia lá de cima, das serranias e ameaçava invadir-lhe a casa. Corri. Refugiei-me no café da terra, uma ilha num oceano de água lamacenta e zangada, a tempo de ver Rafael Santos, o presidente da Junta de Freguesia: “Temos de tirar dali o Ti Chico, ‘tá acamado, tem de saír dali”. A dona do café, sempre a limpar a água com uma vassoura: “Aquilo ali, no meio da água, é um pedaço de alcatrão? Minha Nossa Senhora...”
A primeira rasteira veio da própria ribeira da aldeia. A água lamacenta estendera-se num lago que me fez cirandar irritado pelo sapal e procurar contornar a pequena laguna pela estrada. Percebi rápidamente o mesmo que três jovens surfistas espanhois: O caminho em tábuas de madeira que desce para a praia, estacava abruptamente nas águas revoltosas da ribeira que cortavam as duas margens de areia como frágeis fatias de um bolo.
À saída da aldeia, já sob chuva torrencial, um alemão surgiu de uma reconstruída casa rural em pedra de xisto. “Vem para cá, não vais querer ir a pé com um temporal desses”, chamou, uma chaleira numa mão e um bocado de pão na outra. Apontei para a sua banca de abóboras com um cartão “vende-se” cruelmente fustigado pela ventania e respondi: “Também me parece que não vais conseguir vender abóboras hoje”. Sorriu, fechou a porta e eu continuei a minha caminhada insensata em direcção a Aljezur. Portugal a pé? Naquele momento, o termo apropriado seria massacre a pé. Deixara Sagres posta em sossego e sob um sol primaveril dois dias antes, homens a jogar boliche na praça central, surfistas de pernas espetadas no tablier dos jeeps, nómadas loiros beberricando cerveja junto a auto-caravanas.
Cruzara falésias brancas de calcário, o verde recortado dos carrascos competindo com o amarelo da perpétua, a das areias. Cumprimentara uma pastora do seculo XXI, observando as ovelhas à distância, o bordão dentro da viatura. Jogara calhaus rolados na Praia do Castelejo só para escutar o baque surdo nas águas, chutara pinhas, falara sozinho, cantara Jorge Palma no Miradouro da Barriga- “Eu venho do nada porque arrasei o que não quis em nome da estrada onde só quero ser feliz...
Agora, a caminhada não passava de um exercício insano, varrida por água e vento em revoadas. Parei à entrada da Bordeira, a pequena aldeia branca sob um dilúvio de chuva. Foi quando vi a senhora, num terraço. Um rio caudaloso descia lá de cima, das serranias e ameaçava invadir-lhe a casa. Corri. Refugiei-me no café da terra, uma ilha num oceano de água lamacenta e zangada, a tempo de ver Rafael Santos, o presidente da Junta de Freguesia: “Temos de tirar dali o Ti Chico, ‘tá acamado, tem de saír dali”. A dona do café, sempre a limpar a água com uma vassoura: “Aquilo ali, no meio da água, é um pedaço de alcatrão? Minha Nossa Senhora...”
GRANDE JUNHO
E pois é assim.
Começam os preparativos para o meu grande Junho:
Dia 21- Bruce Springsteen em Hamburgo
Dia 23- O mesmo em Antuérpia
Dia 25- Idem aspas em San Siro, Milão
Dia 27- Paris, Parque dos Príncipes
E o homem que espere por mim para o gran finale europeu em Barcelona, no Nou Camp, em Julho
Começam os preparativos para o meu grande Junho:
Dia 21- Bruce Springsteen em Hamburgo
Dia 23- O mesmo em Antuérpia
Dia 25- Idem aspas em San Siro, Milão
Dia 27- Paris, Parque dos Príncipes
E o homem que espere por mim para o gran finale europeu em Barcelona, no Nou Camp, em Julho
2008-05-20
2008-05-19
2008-04-18
2008-04-17
Bruce Springsteen apoia Barack Obama!
Eu preferia o Boss para presidente mas está bem, sim senhor, OBAMA FOR PRESIDENT!
2008-04-06
2008-03-24
2008-03-20
PORTUGAL VIOLENTO
Portugal está mais violento...na TVI...no Correio da Manhã...um Portugal violento e sangrento à sua espera, todos os dias. Não perca as edições dos próximos dias.
2008-03-14
TODOS QUEREM SER CHEFES
MAN AT THE TOP SAYS IT'S LONELY UP THERE.
IF IT IS MAN, I DON'T CARE.
MAN AT THE TOP
Here comes a lawyer,here comes a cop.
Here comes a rich, here comes a car-hop.
Goin' on forever, ain't ever gonna stop.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Well, name your gun, son, shoot your shot.
Everybody wants to be the man at the top.
Now rich man, poor man, beggar man, thief.
Doctor, lawyer, indian chief.
Don't ever start to ask them why.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Well, name your gun, son, shoot your shot.
Everybody wants to be the man at the top.
All right (All right). Oh yeah (Oh yeah)
All right now (All right). Oh yeah (Oh yeah)
MAN AT THE TOP SAYS IT'S LONELY UP THERE.
IF IT IS MAN, I DON'T CARE. From the big white house.
From a parking lot. Everybody wants to be the man at the
top.
Here comes a banker, here comes a businessman.
Here comes a kid with a guitar in his hand.
Dreamin' of his record in number one spot.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Well, name your gun son, shoot your shot.
Everybody wants to be the man at the top.
Say right now (All right). Say yeah now (Oh yeah)
Say right...Who's the man at the top?
Who's the man at the top, now?
IF IT IS MAN, I DON'T CARE.
MAN AT THE TOP
Here comes a lawyer,here comes a cop.
Here comes a rich, here comes a car-hop.
Goin' on forever, ain't ever gonna stop.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Well, name your gun, son, shoot your shot.
Everybody wants to be the man at the top.
Now rich man, poor man, beggar man, thief.
Doctor, lawyer, indian chief.
Don't ever start to ask them why.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Well, name your gun, son, shoot your shot.
Everybody wants to be the man at the top.
All right (All right). Oh yeah (Oh yeah)
All right now (All right). Oh yeah (Oh yeah)
MAN AT THE TOP SAYS IT'S LONELY UP THERE.
IF IT IS MAN, I DON'T CARE. From the big white house.
From a parking lot. Everybody wants to be the man at the
top.
Here comes a banker, here comes a businessman.
Here comes a kid with a guitar in his hand.
Dreamin' of his record in number one spot.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Everybody wants to be the man at the top.
Well, name your gun son, shoot your shot.
Everybody wants to be the man at the top.
Say right now (All right). Say yeah now (Oh yeah)
Say right...Who's the man at the top?
Who's the man at the top, now?
Governador de Nova Iorque
O homem precisa de mudar para Portugal. Pagou 4.500 dólares a uma prostituta de luxo que também canta e tal mas, feitas bem as contas, com esse dinheiro em Portugal arranjavam-lhe um coro inteiro...Otário! Bexigoso! Ainda por cima és careca! E dizes que estás muito arrependido, arrependido por fora, por dentro estás todo contente...22 aninhos, cantora, ganda manganão!
2008-03-09
Onda de violência de dois metros e meio
Portugal está muito violento. Acho que vou mudar para o Rio de Janeiro.
2008-02-26
2008-02-06
YES YOU CAN
It was a creed written into the founding documents that declared the destiny of a nation.
Yes we can.
It was whispered by slaves and abolitionists as they blazed a trail toward freedom.
Yes we can.
It was sung by immigrants as they struck out from distant shores and pioneers who pushed westward against an unforgiving wilderness.
Yes we can.
It was the call of workers who organized; women who reached for the ballots; a President who chose the moon as our new frontier; and a King who took us to the mountaintop and pointed the way to the Promised Land.
Yes we can to justice and equality.
Yes we can to opportunity and prosperity.
Yes we can heal this nation.
Yes we can repair this world.
Yes we can.
We know the battle ahead will be long, but always remember that no matter what obstacles stand in our way, nothing can stand in the way of the power of millions of voices calling for change.
We have been told we cannot do this by a chorus of cynics...they will only grow louder and more dissonant ........... We've been asked to pause for a reality check. We've been warned against offering the people of this nation false hope.
But in the unlikely story that is America, there has never been anything false about hope.
Now the hopes of the little girl who goes to a crumbling school in Dillon are the same as the dreams of the boy who learns on the streets of LA; we will remember that there is something happening in America; that we are not as divided as our politics suggests; that we are one people; we are one nation; and together, we will begin the next great chapter in the American story with three words that will ring from coast to coast; from sea to shining sea --
Yes. We. Can.
2008-01-29
PORTUGUESE AND PROUD
Sarah Borges, a country-rocker luso-americana do momento. De Boston para o mundo!
O fogareiro
Afasta lá o fogareiro!
Rua da Palma: A camioneta de mudanças de caixa aberta ultrapassa repentinamente o táxi sem sinal nem aviso prévio. À minha frente, o toldo da parte de trás esvoaça enquanto o taxista trava a fundo e pragueja: “Grande camelo, ‘tás na corrida, logo de manhã!” A carrinha desaparece por momentos engolida pelo tráfego congestionado da manhã do Martim Moniz mas o taxista não desarma. Alcança-a em plena Rua dos Fanqueiros, junto à porta de uma loja. Roda rápidamente a maçaneta da porta e dispara: “Andas a dormir? Vê lá se acordas, oh palhaço!” O discurso tem de ser curto e incisivo, que mais tráfego se adivinha pelo vidro coberto de chuviscos da traseira. O camionista debruça-se quase deitado sobre o colega sentado no lugar do morto e responde em bom português: “Afasta lá o fogareiro, oh animal!”
Rua da Palma: A camioneta de mudanças de caixa aberta ultrapassa repentinamente o táxi sem sinal nem aviso prévio. À minha frente, o toldo da parte de trás esvoaça enquanto o taxista trava a fundo e pragueja: “Grande camelo, ‘tás na corrida, logo de manhã!” A carrinha desaparece por momentos engolida pelo tráfego congestionado da manhã do Martim Moniz mas o taxista não desarma. Alcança-a em plena Rua dos Fanqueiros, junto à porta de uma loja. Roda rápidamente a maçaneta da porta e dispara: “Andas a dormir? Vê lá se acordas, oh palhaço!” O discurso tem de ser curto e incisivo, que mais tráfego se adivinha pelo vidro coberto de chuviscos da traseira. O camionista debruça-se quase deitado sobre o colega sentado no lugar do morto e responde em bom português: “Afasta lá o fogareiro, oh animal!”
2008-01-28
OBAMA!!!
Se votasse nas próximas eleições norte-americanas, o Estradas Perdidas já tinha o seu candidato. Obama, traz a verdadeira América de volta!
TACUARA, em versão toma e embrulha
Isto é assim, quem sabe sabe e mais tarde ou mais cedo mostra que sabe ou pensam que é só importar um paraguaio de 22 anos e a jogar na Argentina, colocar num botão e exigir dele o máximo, como se não tivesse saudades de Assunção e das garotas de olhos pretos e cabelos pretos...
Uma tarde na esquadra
Braços estendidos no rebordo da janela do guichet da esquadra, um homem desespera. A fé na justiça portuguesa já teve melhores dias. “Seguimento? Isso tem sempre, desde que sejam encontrados suspeitos. Parado é que não fica. Há-de chegar uma altura em que por falta de provas ou de suspeitos, a investigação chega ao fim”, explica-lhe o sub-chefe. Mesmo por trás, sentado numa mesa com três telefones à frente, um guarda pergunta: “O quê? Foi furtado? Já apresentou queixa?”
Ao contrário de outras esquadras, onde existe muita vida nocturna, as noites na dos Olivais costumam ser mais ou menos calmas. “É um dormitório, depois das 2h00, o atendimento morre”, explica o sub-chefe, um molhe de impressos à sua frente a preencher detalhadamente de cada vez que alguém se abeira, de rosto angustiado, da janelinha do guichet.
“Isto aqui é imprevisível. Estive de serviço na noite de Natal e não apareceu ninguém”. Naquele preciso momento, lida com o que poderíamos designar de pequenas queixas: um furto no interior de um veículo e o roubo de um telemóvel de um operador de câmara da televisão.
Surge do nada um homem forte, encorpado, respirando auto-confiança. Ergue um cartão à janela do guichet e dispara: “Boas tardes, sou sargento da força-aérea!” Os agentes entreolham-se, como se perguntassem um ao outro: “E daí?”
O homem está indignado com o que alguém anda a fazer a uma vistosa viatura estacionada algures junto a uma bomba de gasolina da Encarnação. “Mas é que o carro está a ser descascado completamente. Mete pena, está a ver? Provavelmente foi roubado e deixaram-no ali”. Pergunta o subchefe: “E já sabe se nós sabemos se o carro foi roubado?” Um guarda de cabelos aloirados, que segue toda a conversa, mostra conhecer bem o que se passa: “Já sei que carro é. Não consta para apreensão”. O homem não se demove: “É pena, está a ver, um carro quase novo que ‘tá ali e mete pena, de dia para dia a descascar”. O guarda esforça-se por mostrar que compreende a situação: “Certo. Simplesmente já fizemos diligências e o carro não consta para apreensão...” O sub-chefe levanta-se da cadeira, abre os braços e questiona, a menos de um metro do sargento da força-aérea: “Se o proprietário não se importa, a polícia vai-se importar? Temos os nossos parques cheios...temos a apodrecer carros melhores que aquele...”
O rádio da polícia, ligado permanentemente aos carros-patrulha, anuncia que uma residência da Avenida Gago Coutinho foi assaltada. Uma mulher loira, de nariz levemente esmurrado e casaco peludo, interrompe a conversa: “Desculpe lá. Não se esqueceu de mim, pois não?” É a dona de um café na Encarnação que foi vítima de agressão no interior do estabelecimento. “Foi um guarda ao local? Ah sim? Então, temos aqui a ocorrência. Vão procurar o registo da ocorrência, na segunda-feira às 12h00”, pede o sub-chefe. “O rapaz fugiu mas o pai e o meio irmão ficaram lá...” O rapaz? Isso significa que ele é menor? “Tem 14 anos... mas é forte, deu-me um soco no nariz e atingiu-me aqui” A mulher mostra o queixo levemente vermelho. “Já fui duas vezes ao hospital”.
O sub-chefe abana a cabeça. O rapaz pode ser forte, ter todo o corpo do mundo mas é menor. “Ele vai ter de ir para o tribunal de menores. A lei considera que ele ainda não é consciente do que faz”, explica. A dona do café discorda, sabe que ele faz aquilo com toda a consciência alicerçada nos ombros largos de delinquente: “Não vai à escola, passa a vida a fazer distúrbios, vai para a porta das escolas roubar e meter-se com os estudantes”. Paciência, nada a fazer, espere pelos 18 anos.
“O quê?”, pergunta o guarda de serviço aos telefones, “estão a chamar-lhe nomes e a dar-lhe pontapés na porta? Ok, ok, vou mandar já um carro passar aí, tenha calma!”
Uma mãe e filha, irrompem com o susto estampado nos rostos. Querem apresentar queixa por causa de uma tentativa de roubo e agressão à porta de casa. A filha foi a vítima mas a mãe parece bem mais perturbada. “Lá na nossa rua, assaltaram dois carros e acho que tem tudo a ver”. O sub-chefe quer que a jovem lhe descreva o assaltante. “Era um rapazito, atacou-me com uma navalha, agarrou-se-me à mala, eu agarrei-me a ela...” Viu bem a cara dele? “Vi”, diz a rapariga, de ar determinado. Bom, pista já existe mas a acumulação de queixosos no hall da esquadra começa a atrasar o trabalho de atendimento do sub-chefe.
“Ouça, o problema é que neste momento a queixa vai demorar uma hora e meia porque está mais gente à espera. Não pode cá vir à noite?”
Ao contrário de outras esquadras, onde existe muita vida nocturna, as noites na dos Olivais costumam ser mais ou menos calmas. “É um dormitório, depois das 2h00, o atendimento morre”, explica o sub-chefe, um molhe de impressos à sua frente a preencher detalhadamente de cada vez que alguém se abeira, de rosto angustiado, da janelinha do guichet.
“Isto aqui é imprevisível. Estive de serviço na noite de Natal e não apareceu ninguém”. Naquele preciso momento, lida com o que poderíamos designar de pequenas queixas: um furto no interior de um veículo e o roubo de um telemóvel de um operador de câmara da televisão.
Surge do nada um homem forte, encorpado, respirando auto-confiança. Ergue um cartão à janela do guichet e dispara: “Boas tardes, sou sargento da força-aérea!” Os agentes entreolham-se, como se perguntassem um ao outro: “E daí?”
O homem está indignado com o que alguém anda a fazer a uma vistosa viatura estacionada algures junto a uma bomba de gasolina da Encarnação. “Mas é que o carro está a ser descascado completamente. Mete pena, está a ver? Provavelmente foi roubado e deixaram-no ali”. Pergunta o subchefe: “E já sabe se nós sabemos se o carro foi roubado?” Um guarda de cabelos aloirados, que segue toda a conversa, mostra conhecer bem o que se passa: “Já sei que carro é. Não consta para apreensão”. O homem não se demove: “É pena, está a ver, um carro quase novo que ‘tá ali e mete pena, de dia para dia a descascar”. O guarda esforça-se por mostrar que compreende a situação: “Certo. Simplesmente já fizemos diligências e o carro não consta para apreensão...” O sub-chefe levanta-se da cadeira, abre os braços e questiona, a menos de um metro do sargento da força-aérea: “Se o proprietário não se importa, a polícia vai-se importar? Temos os nossos parques cheios...temos a apodrecer carros melhores que aquele...”
O rádio da polícia, ligado permanentemente aos carros-patrulha, anuncia que uma residência da Avenida Gago Coutinho foi assaltada. Uma mulher loira, de nariz levemente esmurrado e casaco peludo, interrompe a conversa: “Desculpe lá. Não se esqueceu de mim, pois não?” É a dona de um café na Encarnação que foi vítima de agressão no interior do estabelecimento. “Foi um guarda ao local? Ah sim? Então, temos aqui a ocorrência. Vão procurar o registo da ocorrência, na segunda-feira às 12h00”, pede o sub-chefe. “O rapaz fugiu mas o pai e o meio irmão ficaram lá...” O rapaz? Isso significa que ele é menor? “Tem 14 anos... mas é forte, deu-me um soco no nariz e atingiu-me aqui” A mulher mostra o queixo levemente vermelho. “Já fui duas vezes ao hospital”.
O sub-chefe abana a cabeça. O rapaz pode ser forte, ter todo o corpo do mundo mas é menor. “Ele vai ter de ir para o tribunal de menores. A lei considera que ele ainda não é consciente do que faz”, explica. A dona do café discorda, sabe que ele faz aquilo com toda a consciência alicerçada nos ombros largos de delinquente: “Não vai à escola, passa a vida a fazer distúrbios, vai para a porta das escolas roubar e meter-se com os estudantes”. Paciência, nada a fazer, espere pelos 18 anos.
“O quê?”, pergunta o guarda de serviço aos telefones, “estão a chamar-lhe nomes e a dar-lhe pontapés na porta? Ok, ok, vou mandar já um carro passar aí, tenha calma!”
Uma mãe e filha, irrompem com o susto estampado nos rostos. Querem apresentar queixa por causa de uma tentativa de roubo e agressão à porta de casa. A filha foi a vítima mas a mãe parece bem mais perturbada. “Lá na nossa rua, assaltaram dois carros e acho que tem tudo a ver”. O sub-chefe quer que a jovem lhe descreva o assaltante. “Era um rapazito, atacou-me com uma navalha, agarrou-se-me à mala, eu agarrei-me a ela...” Viu bem a cara dele? “Vi”, diz a rapariga, de ar determinado. Bom, pista já existe mas a acumulação de queixosos no hall da esquadra começa a atrasar o trabalho de atendimento do sub-chefe.
“Ouça, o problema é que neste momento a queixa vai demorar uma hora e meia porque está mais gente à espera. Não pode cá vir à noite?”
2008-01-01
MÚSICA PARA 2008
F THE CC
I used to listen to the radio
And I don’t guess they’re listenin’ to me no more
They talk too much but that’s okay
I don’t understand a single word they say
Piss and moan about the immigrants
But don’t say nothin’ about the president
A democracy don’t work that way
I can say anything I wanna say
So fuck the FCC
Fuck the FBI
Fuck the CIA
Livin’ in the motherfuckin’ USA
People tell me that I’m paranoid
And I admit I’m gettin’ pretty nervous, boy
It just gets tougher everyday
To sit around and watch it while it slips away
Been called a traitor and a patriot
Call me anything you want to but
Just don’t forget your history
Dirty Lenny died so we could all be free
2007-12-31
A ÚLTIMA NOITE DO ANO DE 1990
Passam dez minutos da meia noite. Lá em baixo, no Cais de Alcântara, barcos e sirenes da Lisnave acabam de assinalar o ano de 1991. No bar da Brigada de Trânsito, as patrulhas que sairão daí a pouco, aproveitam para retirar de uma mesa comprida, pedaços de Bolo Rei. “As patrulhas fixas já saíram, agora a nossa missão é ir aonde for preciso”, explica o Cabo Vitor Pessoa. Ele chefia uma equipa de 18 pessoas que estão espalhados em patrulhas fixas um pouco por todo o distrito.
À meia noite e meia, já Pessoa e o conductor Caria estão em plena portagem da Ponte 25 de Abril. Uma família, a avó, os pais e uma criança segurando uma boneca, atravessam a estrada por entre buzinadelas. Vêem com cara de poucos amigos. O que é que se passa? “Não se passa nada”, afirma a mulher mais velha, toda ela um misto de aborrecimento e cansaço, “só queremos é ir para casa”. O Cabo Pessoa apercebe-se de que algo mais se passara. “Foi só 1,85”, explica-lhe sorridente o colega de serviço no local. Refere-se óbviamente à taxa de alcoolémia medida pelo balão, cujo limite é de 0,50. O pai de família deixa-se ficar, a boneca debaixo do braço, o olhar ensonado e alcoolizado. A miúda já dorme nos braços da mãe. Todos parecem dizer: “deixem-nos ir para casa”. Esperam um táxi que os há-de vir buscar porque o condutor não pode conduzir mais essa noite.
O exame de alcoolémia é implacável. Caso acusem uma taxa superior a 0, 50, os condutores não podem mais conduzir. “Mas daqui a duas horas, se acusar já uma taxa inferior, mandamo-lo embora”, explica o cabo Pessoa. Por vezes, há também casos de faróis partidos ou de excesso de lotação. É um nunca acabar de autuações. Um fiat castanho traz o banco traseiro cheio de mulheres. “ Estavamos ali em Miratejo a ver televisão e eu perguntei se queriam ir a Lisboa ver o show do Terreiro do Paço. Quando lá chegámos já aquilo estava a terminar. Caramba, nestes dias não deviam parar a gente assim”, lamenta o condutor.
“Bebi aquela garrafa de vinho verde”
“O que é que tu bebeste?”, pergunta-lhe o amigo. “Bebi aquela garrafa de vinho verde e a cerveja com os camarões. Tu sabes que é verdade”. Depois, esforça-se por nos convencer: “É que eu tenho uma úlcera no duodeno e não posso beber muito”. O amigo parece quase divertido. “Será que te vão passar a multa? Eu bem te disse para passares mais daquele lado. Tinha um pressentimento de que nos íam mandar parar. Bom, se te passarem a multa, dizes ao teu pai”.
O condutor, um rapaz novo e desanuviado, tenta adivinhar os propósitos do guarda que, dentro da pequena guarita, preenche uns papéis. “Só se for por levar uma pessoa a mais. Ainda por cima, ali atrás é tudo família: a minha mulher e as minhas três irmãs”. Uma rapariga aloirada observa a conversa por entre o vidro. O guarda chega com uma multa de cinco mil escudos por excesso de lotação. “Vês? Sabes quanto ganhas-te?”, grita o amigo à rapariga, batendo no vidro. “Ganhas-te 5 mil!”
São duas da manhã, os foliões parecem ainda não ter saído das festas. Tudo decorre em aparente normalidade. Descemos já a auto-estrada em direcção ao Estoril, quando um farol de nevoeiro no máximo encandeia o carro da Brigada de Trânsito. “Tem o vidro partido, vem a encandear as pessoas todas, desligue lá os máximos”. O condutor não parece ter ganho para o susto. No fim de uma mini-perseguição, a viatura da GNR de luzes ligadas, o azul da sirene batendo-lhe no vidro traseiro, o homem não sabe o que dizer.
“Ainda não têm o radiador quente”
“Eu não bebo”, balbucia, “ sou hipertenso, só bebi um bocadito de champanhe. À refeição bebi àguas, de maneiras que...”. O problema principal é o farol. “Eu prometo que amanhã o mando já arranjar.” O Cabo Pessoa envereda por um tom paternalista: “Venha cá senhor Francisco, que idade é que o senhor tem? Setenta e quatro? Devia evitar guiar à noite. Já tem uma carta velhinha.” Quando se prepara para preencher uma ficha estatística, Francisco, reformado da marinha mercante, julga que lhe vai passar uma multa. “Eu só tenho é de pedir desculpa”. Não quer acreditar que não leva multa. “Mas senhor guarda, não há mesmo novidade nenhuma?” Pessoa não perde nunca a paciência: “Não, pode seguir.” Francisco relembra que à refeição só bebeu àgua. “Pode seguir...”
Às 2h30 da manhã, o trânsito da Marginal assemelha-se ao de uma Segunda-feira às 20 h00. Mas curiosamente, não se notam grandes manobras perigosas. “A rapaziada ainda não tem o radiador quente”, comenta Caria, com o seu indesmentível sotaque beirão. “Hoje, vêem todos devagarinho, estão cheios de medo”, diz Pessoa, quase desapontado.
Na estrada junto ao Alcoitão, vários guardas batem com as botas no chão enlameado para afugentar o frio das três da manhã. Desde há uns dez minutos que o Cabo Pessoa ergue aquilo que parece ser uma pistola em direcção aos automobilistas. É o radar, que retirou cuidadosamente de uma mala preta. “Aquele colega que vem ali vai caír, e se não caír vem a mais de 80”, diz Pessoa, de radar apontado. O mostrador marca 106.
“Mas eles vão aos beijinhos”
“Vai meter a boquilha na boca, sopra forte e prolongado”, explica mais tarde ao condutor. Quando termina o teste, pergunta: “Para onde é que você vai?” “Vou para o Alcoitão”, explica. “Ía para o Alcoitão, o teste marca 1,05, vai ter que deixar aqui o carro”.
A recta é propícia a excessos de velocidade e alcoolémia. “Eu já ando aqui há dez anos, uma vez cheguei a apanhar um a 150”, explica um sorridente Cabo Pessoa, “há ali uma boite e eles vêm por aqui para fugir ao nosso controlo na Marginal”.
Por vezes, o mostrador do balão mantem-se teimosamente no zero quando tudo parecia indicar o contrário. “Não, não bebi nada”, diz um rapazinho muito sério, que não parece ter os 18 anos que afirma ter. Alguns automobilistas reverenciam muito os agentes quando se chega à conclusão que não infringiram nada. “Mas está mesmo tudo em ordem?”, pergunta um, “então Bom ano, sim, bom ano.”
À nossa frente, segue agora um Citroen Visa muito devagarinho, que ora oscila para a esquerda, ora para a direita. É uma mulher que vai a conduzir. De repente, a luz dos faróis ilumina o vidro traseiro. “Oh”, exclama Caria, “mas eles vão aos beijinhos!” Vemos os dois ocupantes da viatura encostarem-se um ao outro e beijarem-se. Lá vai o carro em direcção à berma. “Ai a minha vida”, exclama Caria.
Quando finalmente são mandados parar, é uma jovem loira, alta, salto alto, mini saia realçando-lhe o traseiro, que responde às perguntas do Cabo Pessoa. “Não deu conta de que andava de um lado ao outro da estrada?”, inquire com alguma malícia. Ele parece algo ciumento, blusão de cabedal , o corpo franzino. “Olhe que ela não gosta de fotografias”, diz ao fotógrafo. Vinham de uma festa. O adiantado da hora— quatro da manhã- parece indicar que muitos começaram agora a abandonar os reveillons.
“Não vinha ninguém em cima de mim”
Mais adiante, já na estrada de Sintra, é uma carrinha Peugeot 504 que ziguezagueia. “Vêm abraçados”, desespera Pessoa, “é sempre a mesma coisa”. Um rapazinho imberbe, pullover verde, engravatado, explica que só bebeu um bocadinho de champanhe. Mas o problema não é esse.
“Sabe porque é que eu o mandei parar?”, pergunta Pessoa. “Não”. Pessoa: “é que pela luz refletida no vidro traseiro só se via uma cabeça”. “Só uma cabeça?”, pergunta o rapazinho, sorriso amarelado. “Sim, só uma”. “Ah”, responde, “é que ela vinha encostada ao assento com sono”. Pessoa não desarma: “a mim parece-me que ela vinha era encostada a si”. O rapazinho inquieta-se: “não, garanto-lhe que não”. Começa a mostrar-se aborrecido. Ela, pequenina, uma carinha de boneca, o casaquinho encarnado mal servindo de agasalho, tirita de frio. “Acha que eu conseguia guiar com alguém no meu colo?”, contra-ataca o rapaz, “garanto-lhe (enveredando agora por uma tom enfatuado) que não vinha ninguém em cima de mim”.
À medida que a hora avança, os rostos que nos observam das outras viaturas, espelham não só receio mas também muito cansaço. “Vêm todos de cabeça no ar, já lhes vai a dar o sono”, comenta o cabo da Brigada de Trânsito. Por vezes, tem de intervir perante a indisciplina de alguns. “Diga lá aos seus amigos do banco de trás para adormecerem e deixarem de o chatear”, aconselha a um jovem de 18 anos, de Setúbal, que confessara ter bebido “um Whisky”, “só um”.
A hora fatídica dos acidentes
O soldado Caria já sonha com uma bifana quente quando pelas 4h45 o rádio informa de um acidente em Alverca. Enquanto seguimos para lá, vão informando de outras ocorrências. “Agora é a hora deles, é o alcool, o sono, tudo combinado”, explica Pessoa. O GNR de serviço ao rádio informa que num acidente em Ílhavo, um condutor soprou 3, 95 no balão. “Tal era a borracheira daquele gajo!”
Em Alverca, um Ford equilibra-se em cima de um muro, a metade de trás quase a caír para o campo, a outra metade do lado da estrada. O Ford despistou-se, fez um pião e embateu na parte da frente de um táxi. O condutor estava alcoolizado. Resultado: cinco feridos, entre os quais o filho de dois anos do condutor, que fora cuspido com o embate. “‘Tava-lhe com uma vontade”, contava emocionado o guarda que tomou conta da ocorrência, “trazer uma criança daquela idade no banco da frente”.
Às 6h00 da manhã, predominam os grupos ensonados que vêm das festas. “Oh meu Deus”, comenta Caria, “aqueles levam cão e tudo”. Na ponte 25 de Abril, os guardas de serviço não parecem ter tido mãos a medir. “Passam-se dias quase sem autuações, hoje, era todos quantos mandassemos parar”. Um deles passou 25 multas.
“Eles hoje estão cheios de medo”
A última sessão da noite será junto à recta de Paço D’Arcos. “Meta o carro ali atrás da placa para eles dizerem que estamos escondidos”, aconselha o Cabo. Um automobilista para o carro junto à patrulha. “O senhor guarda é capaz de me dizer... aquele radar que têm ali adiante, qual é o limite?” Quando lhe dizem que é 100, respira de alívio. “Ah, ainda bem, eu ía a 80.”Mal ele se vai embora, o Cabo Pessoa não pode deixar de comentar: “Eles hoje estão cheios de medo”.
A luz do Sol ameaça já raiar sobre Paço de Arcos e o desapontamento é evidente entre os guardas. “Não pode ser”, comenta um, “eles vêm tão devagar hoje...” Outro pede ao Cabo: “Oh chefe, arranje lá um excesso de velocidade para mim”. Mas nada feito. O marcador do radar começa invariávelmente a descer mal os automobilistas se apercebem, ao dar a curva, que está ali a GNR. Alguns passam tão ridiculamente devagar que se tornam suspeitos. Surge uma carrinha norte-americana a pouco mais de 40 a hora. “Ele vem a balouçar, enche a estrada toda, manda-o parar”.
Sai lá de dentro um senhor em smoking, echarpe branca, tentando parecer sóbrio. Mas o balão atraiçoa-o: marca 1, 65. terá de ser o amigo corpulento, casaco com brasão, a guiar o carro. Mas fazem-lhe o teste e também acusa. Por fim, sai lá de dentro a esposa, uma senhora em traje de noite. Fazem-lhe o teste, é a última esperança dos dois homens. Terá de ir ela a conduzir. Mas também acusa. O cavalheiro não perde a calma. “Reconheço que vinha alcoolizado”, quase sussurra ao guarda, “mas apelo à sua flexibilidade. A minha mulher poderia conduzir...”
Já a luz de um novo dia irrompe sobre a praia de Santo Amaro quando regressamos ao quartel. Caria e Pessoa ainda terão de lavar a viatura. Já sonham com o pequeno almoço. “Hoje parece que o pessoal ouviu bem os conselhos”, comentava o nosso cabo.
À meia noite e meia, já Pessoa e o conductor Caria estão em plena portagem da Ponte 25 de Abril. Uma família, a avó, os pais e uma criança segurando uma boneca, atravessam a estrada por entre buzinadelas. Vêem com cara de poucos amigos. O que é que se passa? “Não se passa nada”, afirma a mulher mais velha, toda ela um misto de aborrecimento e cansaço, “só queremos é ir para casa”. O Cabo Pessoa apercebe-se de que algo mais se passara. “Foi só 1,85”, explica-lhe sorridente o colega de serviço no local. Refere-se óbviamente à taxa de alcoolémia medida pelo balão, cujo limite é de 0,50. O pai de família deixa-se ficar, a boneca debaixo do braço, o olhar ensonado e alcoolizado. A miúda já dorme nos braços da mãe. Todos parecem dizer: “deixem-nos ir para casa”. Esperam um táxi que os há-de vir buscar porque o condutor não pode conduzir mais essa noite.
O exame de alcoolémia é implacável. Caso acusem uma taxa superior a 0, 50, os condutores não podem mais conduzir. “Mas daqui a duas horas, se acusar já uma taxa inferior, mandamo-lo embora”, explica o cabo Pessoa. Por vezes, há também casos de faróis partidos ou de excesso de lotação. É um nunca acabar de autuações. Um fiat castanho traz o banco traseiro cheio de mulheres. “ Estavamos ali em Miratejo a ver televisão e eu perguntei se queriam ir a Lisboa ver o show do Terreiro do Paço. Quando lá chegámos já aquilo estava a terminar. Caramba, nestes dias não deviam parar a gente assim”, lamenta o condutor.
“Bebi aquela garrafa de vinho verde”
“O que é que tu bebeste?”, pergunta-lhe o amigo. “Bebi aquela garrafa de vinho verde e a cerveja com os camarões. Tu sabes que é verdade”. Depois, esforça-se por nos convencer: “É que eu tenho uma úlcera no duodeno e não posso beber muito”. O amigo parece quase divertido. “Será que te vão passar a multa? Eu bem te disse para passares mais daquele lado. Tinha um pressentimento de que nos íam mandar parar. Bom, se te passarem a multa, dizes ao teu pai”.
O condutor, um rapaz novo e desanuviado, tenta adivinhar os propósitos do guarda que, dentro da pequena guarita, preenche uns papéis. “Só se for por levar uma pessoa a mais. Ainda por cima, ali atrás é tudo família: a minha mulher e as minhas três irmãs”. Uma rapariga aloirada observa a conversa por entre o vidro. O guarda chega com uma multa de cinco mil escudos por excesso de lotação. “Vês? Sabes quanto ganhas-te?”, grita o amigo à rapariga, batendo no vidro. “Ganhas-te 5 mil!”
São duas da manhã, os foliões parecem ainda não ter saído das festas. Tudo decorre em aparente normalidade. Descemos já a auto-estrada em direcção ao Estoril, quando um farol de nevoeiro no máximo encandeia o carro da Brigada de Trânsito. “Tem o vidro partido, vem a encandear as pessoas todas, desligue lá os máximos”. O condutor não parece ter ganho para o susto. No fim de uma mini-perseguição, a viatura da GNR de luzes ligadas, o azul da sirene batendo-lhe no vidro traseiro, o homem não sabe o que dizer.
“Ainda não têm o radiador quente”
“Eu não bebo”, balbucia, “ sou hipertenso, só bebi um bocadito de champanhe. À refeição bebi àguas, de maneiras que...”. O problema principal é o farol. “Eu prometo que amanhã o mando já arranjar.” O Cabo Pessoa envereda por um tom paternalista: “Venha cá senhor Francisco, que idade é que o senhor tem? Setenta e quatro? Devia evitar guiar à noite. Já tem uma carta velhinha.” Quando se prepara para preencher uma ficha estatística, Francisco, reformado da marinha mercante, julga que lhe vai passar uma multa. “Eu só tenho é de pedir desculpa”. Não quer acreditar que não leva multa. “Mas senhor guarda, não há mesmo novidade nenhuma?” Pessoa não perde nunca a paciência: “Não, pode seguir.” Francisco relembra que à refeição só bebeu àgua. “Pode seguir...”
Às 2h30 da manhã, o trânsito da Marginal assemelha-se ao de uma Segunda-feira às 20 h00. Mas curiosamente, não se notam grandes manobras perigosas. “A rapaziada ainda não tem o radiador quente”, comenta Caria, com o seu indesmentível sotaque beirão. “Hoje, vêem todos devagarinho, estão cheios de medo”, diz Pessoa, quase desapontado.
Na estrada junto ao Alcoitão, vários guardas batem com as botas no chão enlameado para afugentar o frio das três da manhã. Desde há uns dez minutos que o Cabo Pessoa ergue aquilo que parece ser uma pistola em direcção aos automobilistas. É o radar, que retirou cuidadosamente de uma mala preta. “Aquele colega que vem ali vai caír, e se não caír vem a mais de 80”, diz Pessoa, de radar apontado. O mostrador marca 106.
“Mas eles vão aos beijinhos”
“Vai meter a boquilha na boca, sopra forte e prolongado”, explica mais tarde ao condutor. Quando termina o teste, pergunta: “Para onde é que você vai?” “Vou para o Alcoitão”, explica. “Ía para o Alcoitão, o teste marca 1,05, vai ter que deixar aqui o carro”.
A recta é propícia a excessos de velocidade e alcoolémia. “Eu já ando aqui há dez anos, uma vez cheguei a apanhar um a 150”, explica um sorridente Cabo Pessoa, “há ali uma boite e eles vêm por aqui para fugir ao nosso controlo na Marginal”.
Por vezes, o mostrador do balão mantem-se teimosamente no zero quando tudo parecia indicar o contrário. “Não, não bebi nada”, diz um rapazinho muito sério, que não parece ter os 18 anos que afirma ter. Alguns automobilistas reverenciam muito os agentes quando se chega à conclusão que não infringiram nada. “Mas está mesmo tudo em ordem?”, pergunta um, “então Bom ano, sim, bom ano.”
À nossa frente, segue agora um Citroen Visa muito devagarinho, que ora oscila para a esquerda, ora para a direita. É uma mulher que vai a conduzir. De repente, a luz dos faróis ilumina o vidro traseiro. “Oh”, exclama Caria, “mas eles vão aos beijinhos!” Vemos os dois ocupantes da viatura encostarem-se um ao outro e beijarem-se. Lá vai o carro em direcção à berma. “Ai a minha vida”, exclama Caria.
Quando finalmente são mandados parar, é uma jovem loira, alta, salto alto, mini saia realçando-lhe o traseiro, que responde às perguntas do Cabo Pessoa. “Não deu conta de que andava de um lado ao outro da estrada?”, inquire com alguma malícia. Ele parece algo ciumento, blusão de cabedal , o corpo franzino. “Olhe que ela não gosta de fotografias”, diz ao fotógrafo. Vinham de uma festa. O adiantado da hora— quatro da manhã- parece indicar que muitos começaram agora a abandonar os reveillons.
“Não vinha ninguém em cima de mim”
Mais adiante, já na estrada de Sintra, é uma carrinha Peugeot 504 que ziguezagueia. “Vêm abraçados”, desespera Pessoa, “é sempre a mesma coisa”. Um rapazinho imberbe, pullover verde, engravatado, explica que só bebeu um bocadinho de champanhe. Mas o problema não é esse.
“Sabe porque é que eu o mandei parar?”, pergunta Pessoa. “Não”. Pessoa: “é que pela luz refletida no vidro traseiro só se via uma cabeça”. “Só uma cabeça?”, pergunta o rapazinho, sorriso amarelado. “Sim, só uma”. “Ah”, responde, “é que ela vinha encostada ao assento com sono”. Pessoa não desarma: “a mim parece-me que ela vinha era encostada a si”. O rapazinho inquieta-se: “não, garanto-lhe que não”. Começa a mostrar-se aborrecido. Ela, pequenina, uma carinha de boneca, o casaquinho encarnado mal servindo de agasalho, tirita de frio. “Acha que eu conseguia guiar com alguém no meu colo?”, contra-ataca o rapaz, “garanto-lhe (enveredando agora por uma tom enfatuado) que não vinha ninguém em cima de mim”.
À medida que a hora avança, os rostos que nos observam das outras viaturas, espelham não só receio mas também muito cansaço. “Vêm todos de cabeça no ar, já lhes vai a dar o sono”, comenta o cabo da Brigada de Trânsito. Por vezes, tem de intervir perante a indisciplina de alguns. “Diga lá aos seus amigos do banco de trás para adormecerem e deixarem de o chatear”, aconselha a um jovem de 18 anos, de Setúbal, que confessara ter bebido “um Whisky”, “só um”.
A hora fatídica dos acidentes
O soldado Caria já sonha com uma bifana quente quando pelas 4h45 o rádio informa de um acidente em Alverca. Enquanto seguimos para lá, vão informando de outras ocorrências. “Agora é a hora deles, é o alcool, o sono, tudo combinado”, explica Pessoa. O GNR de serviço ao rádio informa que num acidente em Ílhavo, um condutor soprou 3, 95 no balão. “Tal era a borracheira daquele gajo!”
Em Alverca, um Ford equilibra-se em cima de um muro, a metade de trás quase a caír para o campo, a outra metade do lado da estrada. O Ford despistou-se, fez um pião e embateu na parte da frente de um táxi. O condutor estava alcoolizado. Resultado: cinco feridos, entre os quais o filho de dois anos do condutor, que fora cuspido com o embate. “‘Tava-lhe com uma vontade”, contava emocionado o guarda que tomou conta da ocorrência, “trazer uma criança daquela idade no banco da frente”.
Às 6h00 da manhã, predominam os grupos ensonados que vêm das festas. “Oh meu Deus”, comenta Caria, “aqueles levam cão e tudo”. Na ponte 25 de Abril, os guardas de serviço não parecem ter tido mãos a medir. “Passam-se dias quase sem autuações, hoje, era todos quantos mandassemos parar”. Um deles passou 25 multas.
“Eles hoje estão cheios de medo”
A última sessão da noite será junto à recta de Paço D’Arcos. “Meta o carro ali atrás da placa para eles dizerem que estamos escondidos”, aconselha o Cabo. Um automobilista para o carro junto à patrulha. “O senhor guarda é capaz de me dizer... aquele radar que têm ali adiante, qual é o limite?” Quando lhe dizem que é 100, respira de alívio. “Ah, ainda bem, eu ía a 80.”Mal ele se vai embora, o Cabo Pessoa não pode deixar de comentar: “Eles hoje estão cheios de medo”.
A luz do Sol ameaça já raiar sobre Paço de Arcos e o desapontamento é evidente entre os guardas. “Não pode ser”, comenta um, “eles vêm tão devagar hoje...” Outro pede ao Cabo: “Oh chefe, arranje lá um excesso de velocidade para mim”. Mas nada feito. O marcador do radar começa invariávelmente a descer mal os automobilistas se apercebem, ao dar a curva, que está ali a GNR. Alguns passam tão ridiculamente devagar que se tornam suspeitos. Surge uma carrinha norte-americana a pouco mais de 40 a hora. “Ele vem a balouçar, enche a estrada toda, manda-o parar”.
Sai lá de dentro um senhor em smoking, echarpe branca, tentando parecer sóbrio. Mas o balão atraiçoa-o: marca 1, 65. terá de ser o amigo corpulento, casaco com brasão, a guiar o carro. Mas fazem-lhe o teste e também acusa. Por fim, sai lá de dentro a esposa, uma senhora em traje de noite. Fazem-lhe o teste, é a última esperança dos dois homens. Terá de ir ela a conduzir. Mas também acusa. O cavalheiro não perde a calma. “Reconheço que vinha alcoolizado”, quase sussurra ao guarda, “mas apelo à sua flexibilidade. A minha mulher poderia conduzir...”
Já a luz de um novo dia irrompe sobre a praia de Santo Amaro quando regressamos ao quartel. Caria e Pessoa ainda terão de lavar a viatura. Já sonham com o pequeno almoço. “Hoje parece que o pessoal ouviu bem os conselhos”, comentava o nosso cabo.
'BORA ESQUECER A CRISE HOJE À NOITE!
-'Bora esquecer a crise hoje à noite!
- Mas...e a crise política no Paquistão? E a taxa de desemprego? E a crise no BCP? E as restrições ao tabaco? Consegues festejar com tantos problemas a rodear-te como um anel de fogo?
-Exactamente, é isso que vou fazer hoje à noite na praia, um anel de fogo! Dava-te um beijo na testa se fosses mulher...
- Vês, vais começar o ano de 2008 com os mesmos preconceitos de 2007.
- Um anel de fogo, é isso e muita cerveja e rock'nroll! Fixe, deste-me uma ideia do caraças!
- Tu ,tás é doido. Vou para a cama ler "Portugal, o Medo de Existir"...
- Tá, tapa-te bem não vás apanhar uma constipação intelectual na passagem de 07 para 08...
- Ei pessoal, vamos esquecer a Crise!!! Yuuuuuu....
Nuno olha para a praceta à sua frente, desolada e vazia. De um rés-do-chão, alguém abre a persiana e grita: "Vai p'ra casa, bêbedo! Já tenho as crianças a dormir! E não penses que o défice acaba com a passagem do ano!"
- País de chatos, sempre a chorar. Vou mas é para o Brasil!
A mesma voz, do outro lado da persiana: "Vai e fecha a porta. Não te esqueças que quando lá chegares já a passagem do ano acabou!"
2007-12-29
Pacheco Pereira Cinco Estrelas
Sempre detestei essa coisa do bloguismo e da blogosfera. O que é o bloguismo? Isso existe? E a blogosfera nacional? Para que serve uma blogosfera cujos blogues de referência reproduzem os tiques, as invejazinhas, o amiguismo, a mediocridade da sociedade que representam? A blogosfera só faz sentido se servir para partilhar e enriquecer-nos uns aos outros. Em contrapartida, tudo o que vemos é citações dos amigos, eleições de bloggers do ano, arames farpados e muros de vidro por todo o lado, bombas que ainda não cresceram já são "inteligentes", círculos de conhecidos polemizando em círculos. Por isso estou cem por cento de acordo com Pacheco Pereira hoje no Público. Temos uma blogosferazinha à beira-mar plantada, a face medíocre do portugalzinho onde nasceu.
2007-12-28
RUAS DE SAINT-DENNIS
Dedico este video aos seis polícias que me interpelaram em Saint-Dennis na madrugada de dia 18.
2007-12-27
Pesadelo em Saint-Dennis
Nunca me senti tão estúpido. Porque é que não dei a morada do hotel ao motorista? Agora aqui estou eu ao gelo martirisante de Saint-Dennis, a perigosa, dois graus negativos a fazerem chorar os olhos e dou voltas e mais voltas e nada. Um rio, um neon, uma auto-estrada, carros cobertos de gelo. Viro uma esquina, duas, o Stade France aparece umas vezes à esquerda, outras à direita, como um gigantesco fantasma de metal, gelado, maligno. Quero o meu hotel! Na minha cabeça ainda ecoa "Because The Night" que o swing jazz do Caveau De La Huchette não apagou nem poderá apagar. O poder do gospel, do rock, da mensagem é mais forte e os decibeis também. O Sena parece um manto de água cinzenta gelada, cinzenta como as paredes destes viadutos, destas casas.
Un souvenir de Paris
De repente, dois carros da polícia. Seis polícias à minha volta. Tira tudo dos bolsos, dizem. Tenho que despejar os bolsos, a carteira com os cartões de crédito num banco de cimento. Quero tocar-lhe. "Ne touche pas!", grita um. Peço que me ajudem a encontrar o hotel. "Ça n'ai pas un taxi!" Mexem, remexem, conspurcam as minhas coisas. Eles são a lei, a ordem, La France de Sarkozy. Preparam-se para me abandonar como um cão, tudo espalhado pelo passeio quando peço a identificação a uma agente: "Tu veux quoi? Tu veux quoi? Je te donne la identication!" Empurra-me com a força de um animal enfurecido. As duas viaturas da polícia desaparecem na nuvem fria da noite e eu estupidamente estatelado no passeio. Vem-me à cabeça aquela canção dos The Clash ("Police On My Back") e o verso "what have I done?". Mas tenho de encontrar o hotel. O frio não dá tréguas. Choro de raiva, frio e frustração. De repente, um negro de bicicleta, finalmente alguém. Já pensava que em Saint-Dennis havia recolher obrigatório. "Ibis Stade de France Sud? C'est par la!" Continuo, ando nisto há mais de duas horas. De repente, um túnel, uma viatura escura, quatro homens lá dentro. Um deles, de cabelo grisalho, aponta-me uma lanterna à cara. "Por amor de Deus", explico, "vim de um concerto, só quero o meu hotel, ajudem-me a encontrar o hotel". É à direita, dizem. Desaparecem na madrugada negra do subúrbio com a mesma fúria repentina com que partiram. Devem ter pensado: "Porra, queríamos um magrebino ilegal e saíu-nos um turista português..."
Às 4h20 do dia 18 de Dezembro de 2007 chego finalmente à aquecida recepção do Ibis Stade de France Sud. Desabafo com o recepcionista, peço um cognac. "Saint-Dennis est chaud, savez pas?"
Un souvenir de Paris
De repente, dois carros da polícia. Seis polícias à minha volta. Tira tudo dos bolsos, dizem. Tenho que despejar os bolsos, a carteira com os cartões de crédito num banco de cimento. Quero tocar-lhe. "Ne touche pas!", grita um. Peço que me ajudem a encontrar o hotel. "Ça n'ai pas un taxi!" Mexem, remexem, conspurcam as minhas coisas. Eles são a lei, a ordem, La France de Sarkozy. Preparam-se para me abandonar como um cão, tudo espalhado pelo passeio quando peço a identificação a uma agente: "Tu veux quoi? Tu veux quoi? Je te donne la identication!" Empurra-me com a força de um animal enfurecido. As duas viaturas da polícia desaparecem na nuvem fria da noite e eu estupidamente estatelado no passeio. Vem-me à cabeça aquela canção dos The Clash ("Police On My Back") e o verso "what have I done?". Mas tenho de encontrar o hotel. O frio não dá tréguas. Choro de raiva, frio e frustração. De repente, um negro de bicicleta, finalmente alguém. Já pensava que em Saint-Dennis havia recolher obrigatório. "Ibis Stade de France Sud? C'est par la!" Continuo, ando nisto há mais de duas horas. De repente, um túnel, uma viatura escura, quatro homens lá dentro. Um deles, de cabelo grisalho, aponta-me uma lanterna à cara. "Por amor de Deus", explico, "vim de um concerto, só quero o meu hotel, ajudem-me a encontrar o hotel". É à direita, dizem. Desaparecem na madrugada negra do subúrbio com a mesma fúria repentina com que partiram. Devem ter pensado: "Porra, queríamos um magrebino ilegal e saíu-nos um turista português..."
Às 4h20 do dia 18 de Dezembro de 2007 chego finalmente à aquecida recepção do Ibis Stade de France Sud. Desabafo com o recepcionista, peço um cognac. "Saint-Dennis est chaud, savez pas?"
2007-12-21
BOSS EM PARIS
O Boss passa junta ao lado esquerdo do palco. O super fã Nuno Ferreira estende o braço mas não consegue tocar no gurú
BOSS EM PARIS
PARIS BERCY, 17 de Dezembro de 2007
Devo dizer-vos que devido ao intenso frio que se fazia sentir em Paris, não tenho deste concerto a percepção nítida e objectiva que tenho de todos os que já vi. Tudo por causa de uma garrafa de cognac que comprei para aguentar as horas de espera na fila. O meu amigo Renato diz que viu nevar e realmente também me pareceu vislumbrar a flutuação de umas coisinhas brancas por cima das cabeças dos cerca de 600 que esperavam para ir para o pit.
A espera foi enorme. Cheguei às 9h30, já lá estavam umas 200 pessoas. Houve uns tipos (loucos) que dormiram junto a Bercy com sacos camas e termos. Fui o 233 e percebi que a lista tinha começado a ser efectuada na noite anterior por um italiano. Havia montes de italianos mas também gregos, holandeses, americanos, espanhois, ingleses. Fiquei sossegado quando me disseram que iam caber 600 na frente do palco.
De qualquer forma, e para não variar, os franceses da organização privilegiaram pela arrogância, criando uma grande confusão quanto às entradas. Diziam que se estavam a borrifar para as bandas que um tipo do Springsteen nos ia colocando e mandaram avançar gente com banda e gente que tinha chegado horas depois. Valeu a firmeza do Jerry ou Jeff (?), um americano road manager do Boss cinco estrelas que negociou duramente com um francês de cabelo cortado à escovinha e cara fechada. Percebi que a nossa batalha estava ganha quando vi o francês receber instruções ao telemovel e ir-se embora com cara de poucos amigos.
Por volta das 13h00, deram-nos instruções para regressarmos às 16h00, aí correu tudo muito bem mas a espera foi glacial. Lá fui distribuindo generosas doses de cognac a amigos que fiz na fila, a saber: um bretão, um casal de holandeses, um americano de New Jersey, etc.
Quando corri para dentro do pavilhão e me apercebi que estava na primeira fila, tendo apenas à minha frente os "loucos" que haviam dormido ao relento, parecia que estava a viver um sono. Ao pé de mim, ansiosos, estava um jovel casal de Nápoles, um puto inglês de 14 anos que pulou comigo o tempo todo e que tinha a mãe na bancada, o "meu amigo" de New Jersey e italianos, muitos italianos atrás de mim.
O começo foi um estrondo. O Boss não deu tréguas a Paris, mesmo sabendo que aquele não é o melhor público da Europa mas a sequência foi tão fantástica que não deu tempo para respirar: Radio Nowhere, No Surrender, Night, Lonesome Day...Quando dei por ela estava a suar por todos os poros abraçado ao puto inglês que dois dias depois ia assistir ao show de Londres. Olhava para as bancadas e toda a gente estava aos pulos, incluindo os que tinham assento por trás da banda.
O meu lugar não era exactamente ao centro, mas mais à esquerda, o que me permitiu zarpar uma ou duas vezes pra buscar bijecas sem problemas. Durante o "Livin' in The Future", o homem pairou à nossa frente, ainda pensei que lhe conseguiria tocar mas who cares? Maybe next time!
Long Walk Home e a sequência Jungleland-Born To run e Dancing in The Dark deu cabo de mim. De tal forma que já estava de rastos quando chegou American Land e Santa Claus. Foi a primeira vez que assisti ao vivo ao "Santa Claus is Coming to Town", magnífico...
Devo dizer-vos que devido ao intenso frio que se fazia sentir em Paris, não tenho deste concerto a percepção nítida e objectiva que tenho de todos os que já vi. Tudo por causa de uma garrafa de cognac que comprei para aguentar as horas de espera na fila. O meu amigo Renato diz que viu nevar e realmente também me pareceu vislumbrar a flutuação de umas coisinhas brancas por cima das cabeças dos cerca de 600 que esperavam para ir para o pit.
A espera foi enorme. Cheguei às 9h30, já lá estavam umas 200 pessoas. Houve uns tipos (loucos) que dormiram junto a Bercy com sacos camas e termos. Fui o 233 e percebi que a lista tinha começado a ser efectuada na noite anterior por um italiano. Havia montes de italianos mas também gregos, holandeses, americanos, espanhois, ingleses. Fiquei sossegado quando me disseram que iam caber 600 na frente do palco.
De qualquer forma, e para não variar, os franceses da organização privilegiaram pela arrogância, criando uma grande confusão quanto às entradas. Diziam que se estavam a borrifar para as bandas que um tipo do Springsteen nos ia colocando e mandaram avançar gente com banda e gente que tinha chegado horas depois. Valeu a firmeza do Jerry ou Jeff (?), um americano road manager do Boss cinco estrelas que negociou duramente com um francês de cabelo cortado à escovinha e cara fechada. Percebi que a nossa batalha estava ganha quando vi o francês receber instruções ao telemovel e ir-se embora com cara de poucos amigos.
Por volta das 13h00, deram-nos instruções para regressarmos às 16h00, aí correu tudo muito bem mas a espera foi glacial. Lá fui distribuindo generosas doses de cognac a amigos que fiz na fila, a saber: um bretão, um casal de holandeses, um americano de New Jersey, etc.
Quando corri para dentro do pavilhão e me apercebi que estava na primeira fila, tendo apenas à minha frente os "loucos" que haviam dormido ao relento, parecia que estava a viver um sono. Ao pé de mim, ansiosos, estava um jovel casal de Nápoles, um puto inglês de 14 anos que pulou comigo o tempo todo e que tinha a mãe na bancada, o "meu amigo" de New Jersey e italianos, muitos italianos atrás de mim.
O começo foi um estrondo. O Boss não deu tréguas a Paris, mesmo sabendo que aquele não é o melhor público da Europa mas a sequência foi tão fantástica que não deu tempo para respirar: Radio Nowhere, No Surrender, Night, Lonesome Day...Quando dei por ela estava a suar por todos os poros abraçado ao puto inglês que dois dias depois ia assistir ao show de Londres. Olhava para as bancadas e toda a gente estava aos pulos, incluindo os que tinham assento por trás da banda.
O meu lugar não era exactamente ao centro, mas mais à esquerda, o que me permitiu zarpar uma ou duas vezes pra buscar bijecas sem problemas. Durante o "Livin' in The Future", o homem pairou à nossa frente, ainda pensei que lhe conseguiria tocar mas who cares? Maybe next time!
Long Walk Home e a sequência Jungleland-Born To run e Dancing in The Dark deu cabo de mim. De tal forma que já estava de rastos quando chegou American Land e Santa Claus. Foi a primeira vez que assisti ao vivo ao "Santa Claus is Coming to Town", magnífico...